8 de nov. de 2014

Artigo Prof. Geraldo Filho

Razões para viver um pouco mais!
(07/11/14)

Fico comovido com os sucessivos casos de suicídio no Piauí, em particular no norte do estado, em Parnaíba! Não farei considerações sobre as razões que levaram às tais ações, se de natureza sociológica, psicológica ou neurocerebral. Quem se interessar por esse aspecto da questão recomendo começar lendo O suicídio, livro clássico do grande sociólogo francês Emile Durkheim.
Meu objetivo é de natureza prática, como nos últimos anos faço com os resultados dos conhecimentos que desenvolvo nas ciências sociais e sua interseção com outras ciências, principalmente biologia evolutiva e neurociência.
Assim, a quem está decepcionado e deprimido com a vida, e cujo estado não decorra de causa genético-neurológica severa – o que ocasiona depressão profunda e, como consequência, a necessidade de intervenção psiquiátrica – quero avisar de saída que a vida não é fácil! De fato ela é desconcertante e frustrante por sua essência, pois que sua característica fundamental é a transitoriedade! Tudo é fugaz, passageiro, nada é permanente, se esvai e isso tanto para o bem como para o mal!
Para o bem porque sofrimentos que nos atingem a maior parte de nossas vidas podem, com a passagem do tempo, ser superados ou acomodados. Isso é alguma descoberta genial? Não! É apenas a aplicação da lei do desenvolvimento evolutivo biológico que preside a vida das espécies, dentre elas a humana.
As crises pelas quais passamos enquadram-se na relação entre organização/desorganização/reorganização dos processos sociobiológicos inerentes à vida. Assim, ao enfrentar momentos de turbulência, que geram situações desesperadoras, lembrem-se: cedo ou tarde eles passarão. Provavelmente a sabedoria, para apressar o seu fim, encontre-se na capacidade de resiliência (flexibilidade) para se adaptar às novas realidades.
Mas, como adquirir essa flexibilidade?! Não há uma fórmula geral, eu tenderia a indicar o caminho do conhecimento científico e filosófico, porém ele não é garantia de nada! Só o que eu encontro e conheço é gente que percorreu essa estrada vivendo sofrimento psíquico atroz. Quantos intelectuais não enlouqueceram ou tiraram a vida por não suportarem o peso da existência?! Quantos não se embriagam ou se drogam permanentemente (ou de vez em quando!) em razão da angústia por não terem a certeza de nada, face à incerteza das verdades produzidas?! Quantos não transportaram para os livros os rancores e desilusões de suas biografias e influenciaram, para o mal, a vida de milhões?! Portanto, esse caminho, sendo fundamental, deve ser trilhado com cautela.
O caminho religioso não é muito promissor como promotor de resiliência adaptativa, pois suas certezas – o que seria bom, para quem convive com a instabilidade – sustentam-se nos dogmas, são questões de fé! Isso é mal?! Em si, não! Mas essas certezas, por basearem-se na fé, acabam semeando discórdias entre fiéis de crenças distintas. A história das religiões é pródiga (rica) em exemplos de intolerância contra quem pensa diferente. O mundo muçulmano, por exemplo, não se entende, perpetuando a disputa entre xiitas e sunitas pela interpretação mais perfeita do Alcorão. O cristianismo evangélico multiplica igrejas, decorrência de micro-cismas (divisões) por hermenêutica (interpretação) teológica, e isso desde Lutero.
Nesse caminho abro uma exceção. A vitalidade da Igreja Católica expressa com perfeição a relação organização/desorganização/reorganização. Por isso, como instituição humana e temporal, a Igreja tem 2 mil anos. Idade provecta (adulta) que só poderia ser alcançada como consequência de sua capacidade de adaptação à passagem do tempo e das sociedades. O exemplo atual dessa característica resiliente são as reformas promovidas por Jorge Bergoglio (Papa Francisco), na perspectiva aberta por Joseph Ratzinger (Bento XVI).
Essa exceção não significa proselitismo (defesa de uma crença). Apenas o reconhecimento de que dentre as religiões há aquelas que são mais capazes de estimular a adaptação às transformações do mundo do que outras, porque elas próprias passaram por um processo de autotransformação interna. Mas observem que esse caminho também deve ser feito com cautela, se não fosse assim não precisaria desse alerta, é que os humanos fiéis são melindrosos e ciumentos quanto aos seus deuses!
Para o mal, a passagem do tempo traz para perto de nós a única certeza real: não estaremos aqui dentro de alguns anos! Ah, isso é terrível e mesmo injusto! Nós não sabemos a origem de nada, nem do universo, nem nossa como seres conscientes de nós mesmos, nem o que fazemos aqui nessa vida e nós já temos de ir embora dentro de tão pouco tempo?! Eu responderei que sim, infelizmente é isso mesmo! Creio que não haja um humano que se lhe fosse dada a oportunidade de pedir ao Criador, venerado por sua religião, um último desejo este não seria: “Deixe eu ficar!”. Infelizmente, parece que essa oportunidade jamais será concedida.
Eu lamento quando jovens muçulmanos sacrificam suas preciosas vidas em nome de Alá. Isso é o resultado não de um ato de heroísmo, mas de uma atitude desesperada de fuga de uma vida sexual violentamente reprimida. É sintomático que o prêmio prometido para os jovens mártires seja 70 virgens no Paraíso. Há tempos ouvi uma piada que desmonta a suposta sacralidade desse ato religioso de imolação heróica: “Se a vida no Paraíso é tão boa, por que esses velhos aiatolás e imãs não são os primeiros voluntários para o martírio, em vez de ficarem mandando os jovens?!”
É a partir dessa piada avassaladora, que desmoraliza a seriedade da impostura das instituições que almejam o controle de nossas vidas, que sugiro um caminho para o enfrentamento da existência: a alegria, a gargalhada, o riso propiciado pelo prazer estético. Ou de outra maneira: não levem a sério as instituições (estabelecimentos, criações) humanas, elas são, antes de tudo, apenas respostas, com variado nível de sofisticação e complexidade, para as necessidades naturais da espécie, como comer, beber, procriar, dormir, ter segurança e se divertir (ter alegria, prazer). Pode rir, pois que a vida é só isso, e essa descoberta pode ser libertadora!!!
Libertadora?! Sim, do peso das invenções culturais humanas que se impõem a nós. Olhe a natureza e as demais espécies e olhe agora a nossa espécie. Por que os humanos se acreditam diferentes?! Porque alguém, no passado longínquo, por algum tipo de interesse ou por puro delírio, imaginou e disse que eles eram filhos de Deus, e isso nas mais variadas crenças. Pura imaginação delirante, diria Cornelius Castoriadis, filósofo grego! Tanto é verdade que os altares das diversas religiões têm as mais diversas manifestações divinas. Deus elefante; deusa vaca; deus rato; deus touro; deus leopardo; deus hermafrodita; deus com vários braços e cabeças; deusas com muitos seios; deuses anjos ou demoníacos, com chifres e pés de bode... São inumeráveis as formas de simbologia divina! No entanto, os humanos muitas vezes levam a sério essas tolices e morrem e matam por elas, simplesmente porque não conseguem perceber que são artifícios estéticos elaborados para preencher o vazio da existência. Portanto, é melhor rir desse nonsense e não levar muito a sério as prédicas iracundas daqueles que se apresentam como salvadores de almas!
Continue olhando para a espécie humana e as demais. Sugiro que não acredite muito no amor romântico, como apresentado nos romances, nos cinemas, nas novelas. Ria dele, pois na verdade ele é a síntese do processo de acasalamento da espécie humana. Mas e o casamento eterno e a família?! Tramas da natureza para que a espécie possa se reproduzir e permanecer. Humberto Maturana e Francisco Varela diriam: são formas de acoplamento estrutural que favorecem a preservação e a conservação adaptativa da filogênese da espécie.
Então quer dizer que o amor não existe, é uma armadilha procriativa da espécie?! Não existe, pelo menos esse amor romântico não, por isso ele acaba com três anos em média! O desejo sexual e afetivo que atrai homens e mulheres, tal qual machos e fêmeas de outras espécies, é um truque perpetradro pelo cérebro, que comanda uma extensa rede de circuitos neurais que nos dão essa sensação de bem-estar e de prazer na companhia do parceiro ou parceira. Isso se processa assim para que homens e mulheres fiquem juntos e possam gerar e criar filhos em um mesmo ambiente, chamado de família, que é forjada por laços de amizade e solidariedade entre seus membros. Edward Wilson chamou de “eussocialidade”. Então quer dizer que família não tem nada de sagrado e sério demais como se aprende desde cedo?! Pode rir, mas é isso mesmo. Por isso não sofra com amor! Principalmente mentes jovens.
Garotos e garotas apaixonados que dizem que se amam vivem um autoengano, na realidade o que querem é sexo! Claro que é gostoso, mas não passa disso! São os seus corpos que comandam, ou melhor, o sacana matreiro do seu cérebro que lhe instiga o inconsciente desejo de procriar, travestido na fantasia do amor. Antes de se apaixonar aconselho ler O elogio da loucura. A grande obra de Erasmo de Roterdã. No livro, a deusa Loucura diz que é a responsável por unir os homens e mulheres no casamento... Imaginem o resto, é pura sátira e diversão!!!
Sugiro que aprecie o céu e as estrelas. A Série Cosmos, originariamente criada e apresentada por Carl Sagan nos anos 80, foi aperfeiçoada em 2014 com os novos conhecimentos da astronomia, da química e da física quântica (a realidade infinitamente pequena do mundo subatômico) e apresentada por um discípulo de Sagan. A Série possibilita essa aventura do conhecimento sobre os mistérios e a imensidão do cosmos – que Edgar Morin, no livro O método I,continuação detalhada do livro O enigma humano, denominou de maneira brilhante como “caosmos” – algo que dura 13,8 bilhões de anos terrestres e nos faz concluir que somos o pó das estrelas! Tudo o que existe, materialmente sensível, é o pó da explosão inicial (a singularidade) chamada de “Big-Bang”, condensado pelas quatro forças fundamentais do universo: força nuclear forte (prótons e nêutrons); força fraca (elétrons); força da gravidade e força eletromagnética. Quem quiser se aprofundar nesses temas aconselho a obra do astrofísico brasileiro Marcelo Gleiser, particularmente seu último livro A ilha do conhecimento.
Mas, o mais importante aqui é refletir o que somos, diante da incomensurabilidade, da indefinibilidade, do mistério do universo! É um espetáculo de beleza e pulsação de vida! Nascimento e morte de estrelas, buracos negros, buracos de minhoca, asteróides, cometas, energia escura, etc. O conhecimento de que daqui a 4 bilhões de anos nosso sol se expandirá numa explosão inicial, engolfará a Terra e depois se retrairá e esfriará... Faz-me agarrar e valorizar meus poucos anos terrestres!
Isso é esteticamente tão bonito e prazeroso que Jorge Bergoglio – eis a comprovação da constante autorrenovação da Igreja Católica – recentemente proclamou, diante da Academia de Ciências do Vaticano, que não existe incompatibilidade entre a criação divina e o “Bang”: Deus inspira a criação, mas Dá autonomia a todos os processos vitais desencadeados, eles se autogeram por si próprios, são “autopoíesis”! Maravilhoso e eis mais uma razão para viver mais, admirar e aplaudir esse argentino! Mas...Tinha que ser logo um argentino?! Por isso que é gostoso viver e rir: um argentino nos ensinando a viver! No céu, a música que Deus ouve no momento é um tango!

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