A educação, a saúde e o barulho!
Recentemente, presidi Banca Examinadora de TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) das alunas Brenda de Paulo e Elane Marques, do Curso de Educação/Pedagogia, da UFDPar. Como minhas orientandas, fizeram trabalho original e excelente (obtiveram nota máxima) sobre o tema Rodízio de Recreio, procurando identificar os efeitos dessa atividade no processo de ensino/aprendizagem no Ensino Fundamental da cidade de Parnaíba – PI.
A orientação cientifica foi conduzida de acordo com a neurociência cognitiva, destacando as funções do cérebro envolvidas na aprendizagem: a atenção seletiva (concentração voluntária no que é transmitido como conteúdo para aquele que ouve ou lê) e a inibição dos estímulos distratores (capacidade de isolar interferências na concentração).
O Rodízio de Recreio é o revezamento de turmas durante os turnos para a recreação, de modo que em boa parte do tempo haverá crianças brincando nas dependências das escolas. Em observação de campo, as alunas constataram, junto aos professores, que o barulho resultante das brincadeiras próprias do recreio prejudicava o processo de ensino/aprendizagem que se desenvolvia nas turmas que continuavam em sala de aula, tendo como efeitos imediatos: o aumento da exigência de concentração dos professores e a elevação do tom de voz, ou seja, isolar mentalmente a interferência externa e simultaneamente competir com ela pela atenção dos alunos; o aumento da exigência de concentração dos alunos (cérebros imaturos), facilmente seduzidos pelos ruídos das brincadeiras externas.
Parece óbvio que os envolvidos no processo descrito saem seqüelados: professores estressados, pelo aumento adicional e constante da concentração e da voz, que, em longo prazo, cobra preço alto do sistema nervoso (notem como professores, sobretudo mulheres, falam alto, sem perceberem, em ambientes como o familiar); alunos com graves déficits de aprendizagem por falta de capacidade de atenção (aqueles que chegam à universidade têm enorme dificuldade de ficarem quietos por 100 min, em média), pois carecem de disciplina mental para o foco cognitivo.
O problema, no entanto, não é o Rodízio em si! Brena e Elane perceberam que numa determinada escola, particular, sua estrutura arquitetônica neutralizava os efeitos negativos, ao fazer o revezamento de turmas na recreação em espaço apropriado distante das salas de aula. O problema se torna grave nas escolas públicas, cujos projetos arquitetônicos não possibilitam o conforto de salas acusticamente isoladas ou grandes espaços apropriados para recreação.
Na semana da defesa do TCC coincidiu de eu estar em check-up de saúde, quase faço anualmente, às vezes demora um pouco mais (pela natural chatice que é!), e ao tempo em que lia os ajustes finais no texto do trabalho me encontrei passando algumas horas em clínicas da cidade. Nas salas de espera lá estava o infeliz do barulho a atazanar minha paciência!
A ida a uma clínica médica é uma experiência que gera ansiedade, portanto, já deixa a pessoa fora do equilíbrio emocional! Se for apenas o check-up de rotina a expectativa é que corra tudo bem quanto aos resultados, mas, eis que os exames podem detectar alguma coisa, e aí, da ansiedade pelas boas noticias sua felicidade pode descer ladeira abaixo!
Para um sociobiólogo treinado é também uma experiência socioantropológica sobre o Brasil, pois nas horas que passei nas clínicas eu vi o impacto terrível da deficiência da estrutura educacional (sociologia) se expressando nos comportamentos cotidianos (antropologia) das pessoas, principalmente nos ambientes compartilhados, como salas de espera de clínicas médicas. É um festival de falta de compostura!
Pela ansiedade de se dirigir a um check-up, minimamente se desejaria de uma sala de espera médica a sobriedade e a tranquilidade que o momento exige. Imaginem alguém que já está em tratamento de uma doença, como o câncer, ou de um problema cardiovascular! Até por humanidade essas pessoas merecem um ambiente acolhedor, no qual se sobressaia o silêncio e a paz!
Abram seu celular e digitem no Google “compostura significado”, aparecerá: “2. modo de ser, de estar, de agir, o que revela sobriedade, educação, comedimento.” E ainda traz um exemplo: “Ter compostura para se apresentar em sociedade.” Bem, infelizmente é tudo o que falta nas salas de espera!
Por que diabos alguém vai numa clínica levando a família toda?! Criança de colo (que em breve começa a berrar e chorar!); menino pequeno rolando no chão e correndo nos corredores, gritando, ou jogando jogos eletrônicos com o volume nas alturas?! Só falta o cachorro e o papagaio! Uma amiga ponderou que quem assim age talvez não tenha com quem deixar as crianças, no entanto, um amigo, dono de hospital lembrou que quando vai a shows musicais rapidamente encontra com quem deixá-los!
Por que alguém acha que numa sala de espera médica as outras pessoas devem ouvir suas conversas ao celular, como se estivesse no recôndito de sua casa, tal o tom elevado da voz?! Expõe sua vida privada com se fosse de interesse publico!
Por que alguém imagina que o seu gosto musical deve ser compartilhado com todos ao redor numa sala de espera médica, submetendo as pessoas a ouvirem Genival Lacerda às 9:00 da manhã de uma terça-feira?! Fico imaginado se quem assim procede desconhece a existência civilizatória dos fones de ouvido!
Finalmente! A não ser para determinados tipos de exames, com urologistas ou ginecologistas, nos quais a bermuda para os homens e os vestidos para as mulheres são mais adequados, por que as pessoas se vestem ou como se fossem para uma feira, daquelas bem bregas, ou como se fossem para uma noitada juvenil?! Homens com os famigerados bonés, bermudas horrorosas e chinelos de borracha e o pior, já coroas! Mulheres com as costas nuas, saias curtas e decotes profundos... vi uma fazendo self (de bico, até hoje não sei o que isso significa!) no corredor que leva a Quimioterapia!!!
Felizmente, o período do check-up terminou e sobrevivi a este purgatório, esperando que as administrações das clínicas, para o bem dos seus clientes, adotem a prática saudável de regularmente, pelo sistema de comunicação, reiterar o pedido de uso dos fones de ouvido para quem usa celular; ou que coloquem avisos nas paredes, elegantemente bem compostos, recomendando o civilizado silêncio, principalmente em respeito aos clientes que se tornaram pacientes!