Prof.
Dr. Geraldo Filho (UFPI)
A
batalha entre convicção e responsabilidade é tema permanente e profundo na sociologia
e na ciência política ao analisarem a tomada de decisão dos atores (políticos;
empresários; imprensa; eleitores) envolvidos na estrutura de poder das
sociedades.
Permanente,
pois decisões tomadas a cada configuração política que se constitui
regularmente a cada quatro anos, entre nós, influencia (dependendo do nível de
abrangência ao qual a decisão afeta: federal, estadual ou local) a vida das
pessoas, para o bem ou para o mal.
Profundo,
pois ter nas mãos, a depender do que se pensa e das atitudes adotadas, o
destino de milhares de pessoas deveria ser motivo mais do que razoável para
permanente reflexão introspectiva e prospectiva sobre a vida comum do cotidiano
daqueles sob sua responsabilidade.
Alguém
poderia ponderar que tal comportamento, quase filosófico, seria imaginável numa
sociedade composta por homens com alto preparo intelectual e de qualidade
elevada, quase angelicais! Verdade! Porém, a ingenuidade e a crença na
qualidade dos humanos há muito me deixou (talvez pouco tenha habitado em mim!)!
Assim, sei que os humanos movem-se por vaidade e interesses, muito mais do que
pela retórica populista e vazia que os discursos proferidos querem fazer
acreditar: representante do povo, pai ou mãe dos pobres, opção pelos oprimidos,
luta pela igualdade e contra os preconceitos, etc.
Como
consequência, não se deve esperar muito de onde há pouco a tirar, e isto
independe de ser político brasileiro ou não, mas de todo humano (é claro que a
história mostra que há exceções, mas são raridade, por isso mesmo exceções!)! Essa
constatação pouco feliz, no entanto, não deve imobilizar ou desestimular quem
deseja melhorar as condições de vida de uma sociedade como a brasileira. Pelo
contrário, ela serve como antídoto contra o encanto das soluções mágicas,
rápidas, que prometem a redenção de todas as dificuldades da vida de uma
população de mais de 200 milhões de almas, com graves dificuldades de compreender
a própria existência e o mundo que habitam.
Gosto
de pensar que minha interpretação da relação de Deus com o Diabo seja ilustrativa
do que pretendo dizer. É claro que é uma teologia secular e que a igreja
católica e as evangélicas provavelmente a considerarão heresia! Porém minha
relação com o Criador é pessoal, não depende da mediação de padres e pastores. Portanto,
vejo que Deus, em várias passagens dos Evangelhos utiliza do trabalho do Diabo
para atingir objetivos (os motivos pelos quais Ele fez isto, nunca disse a
razão!): na tentação de Eva, que causou a expulsão do Éden e o começo da
humanidade como se conhece; na tentação de Jó, para exemplificar a fé de um
mortal comum; na tentação de Cristo no deserto, para testar a força moral do
Filho ante o martírio que marcaria o desenlace de sua missão terrena.
Deus
poderia mandar às favas o Diabo, afinal Ele é o Criador, no entanto, sábio como
deve ser, sabia que precisaria de um servo (anjo) de sua estrita confiança para
vez por outra fazer o trabalho duro e sujo de testar a fé dos humanos,
consagrando-se no âmbito do limitado entendimento mortal como a encarnação do
mal.
Quais
possíveis interpretações pode se extrair dessa teologia secular? Que o Criador
há tempos vem mostrando que nem sempre se governa fazendo o bem, constatação
desenvolvida com perspicácia por Niccolo Maquiavelli, em O Príncipe. Às vezes o
que aparece como uma ação má, em determinado momento, reveste-se numa ação boa,
num momento seguinte.
As
reformas pretendidas pelo governo de Michel Temer exemplificam isto. As
esquerdas (formada pelos partidos de sempre, que como disse Delfim Neto: são
contra tudo o que é direito!) se aproveitam da ingenuidade palerma da população
e vendem a imagem de que as reformas contrariam os direitos dos trabalhadores,
dos aposentados, dos jovens alunos. Mas não dizem que as mesmas deveriam ter
sido feitas durante os treze anos e meio que estiveram no poder com Lula e
Dilma. Por que não fizeram? Porque não tinham responsabilidade com as gerações
futuras. Hoje tenho certeza de que não tinham nem convicção, eram ignorantes e
criminosos mesmo, pois se a tivessem teriam evoluído para o caminho da esquerda
europeia, que gerou líderes responsáveis como Tony Blair, Gerhard Schoereder e
Felipe Gonzalez, que arejaram a social-democracia de Inglaterra, Alemanha e
Espanha, no contexto da globalização dos mercados, nos anos 90.
Não
passa, na indigência intelectual dos que gritam fácil “Fora Temer”, uma
pergunta elementar: Por que esse sujeito faria de tudo para ser tão impopular
com essas tais reformas? Melhor seria ser como Lula e Dilma, que depois de
tanta popularidade, entregaram a pior crise econômica e social que o país
viveu, com 13,5 milhões de desempregados, inflação descontrolada e violência em
alta!
Por
interesse e vaidade, Temer, que ao assumir a presidência com 75 anos sabia que
não terá fôlego político (e provavelmente, físico!) para concorrer às eleições
presidenciais de 18, fez das reformas o estandarte de um curto governo de
transição, tendo consciência que deveria imprimir sua marca, para a posteridade
histórica, modernizando relações trabalhistas e a educação (reforma trabalhista
e do ensino médio); dando sustentabilidade financeira para os aposentados das
gerações futuras (reforma da previdência); controlando gastos públicos (PEC do
Teto de Limite de Gastos); apaziguando a economia (macroeconomia: domando a
inflação, baixando os juros e equilibrando o câmbio).
Temer
é corrupto? Pode ser! As investigações devem ser realizadas. Porém, diante da
grave crise que o Brasil vive (a herança maldita deixada pelo PT!), o momento
de investigar o presidente é agora? Ah...! Ponderará alguém, mas você está
condescendendo com a corrupção! Responderei com um enfático não! Estou
refletindo sobre a necessidade urgente de investigar o presidente agora, e
reconhecendo que ele está fazendo o trabalho do Diabo, e que os tolos que agora
berram “Fora Temer” serão beneficiados mais na frente (aliás, já estão, com a
queda da inflação e dos juros!).
Outra
interpretação possível, a partir da minha teologia secular, é a de que como os
humanos são corruptíveis porque são vaidosos e interesseiros, pode-se utilizar
dessa condição para fazer o bem e deixar exemplos construtivos, como fez o
Criador com as três tentações mencionadas. Mas este é um raciocínio cínico!
Sim, mas e daí? O que garante que o presidente que assumirá em 19 terá cacife
político ou a coragem para promover as reformas sem as quais o Brasil
inexoravelmente fracassará como sociedade, e conviver com a desaprovação
ignorante e mal-educada das massas?! Portanto, é melhor que Temer execute o
trabalho que lhe garante um inferno astral agora (torcendo por reconhecimento futuro)
e passe o bastão em 19 com um cenário socioeconômico de estabilidade para o
próximo presidente.
A
ética da convicção leva a tomar decisões baseadas nas crenças professadas, de
qualquer natureza: religiosas, filosóficas, políticas ou supersticiosas. A
ética da responsabilidade obriga a pensar se estas decisões são realmente
corretas e estão sendo aplicadas no momento adequado, tendo em consideração o
menor e o maior ganho social, econômico ou político para os indivíduos. Esse
exercício não é fácil, e atormentou a já débil mente de um dos maiores dos seus
formuladores na sociologia e ciência política: Max Weber!
O
Procurador Geral da República, depois que a Câmara dos Deputados (02/08)
rejeitou o pedido de autorização para processar o presidente no Supremo,
reconheceu candidamente que logo que termine o mandado de Temer, ele será
investigado na justiça comum. Se ele sabia disso, o que o motivou a parar o
Brasil, estancando a marcha das reformas, principalmente a da previdência, e
jogar mais uma vez o país no descrédito internacional, prejudicando a
recuperação econômica do país que estava em andamento, com a retomada a olhos
vistos da produção e do emprego?!
Um
pouco antes, uma operação desastrada da Polícia Federal, que investigava
corrupção em frigoríficos brasileiros, ao comunicar os resultados atingiu uma
das mais importantes cadeias produtivas do Brasil, a exportação de carnes, a
colocando sob suspeita de contaminação. A verdade era que os crimes se
restringiam a um percentual irrisório de empresas e fiscais, mas a pressa
jacobina dos delegados, estimulada pelo clima inquisitorial que assola o país,
que ascendeu procuradores ao altar da santidade e rebaixou empresários e
políticos aos infernos da delinquência, desconsiderou por completo a ética da
responsabilidade, mais uma vez penalizando os brasileiros.
Apesar
disso, o Procurador Geral ameaça com nova denúncia contra o presidente; a
oposição (que não custa lembrar, destruiu e corrompeu o país durante 13,5
anos!) continua sua cantilena contra o país (mais uma vez, não custa lembrar,
apoiam o ditador da Venezuela, e assim revelam o seu real projeto para o
Brasil!); e a imprensa, particularmente as Organizações Globo, que já abrigou
terroristas de esquerda nos seus quadros jornalísticos, diariamente estimula a
desestabilização do governo (por que a Globo não deu destaque ao aumento de
mais de 16% que o Conselho do Ministério Público se concedeu?; porém, alardeou
como absurdo e “compra” de votos a liberação das emendas parlamentares para os
deputados, que são obrigatórias por lei e já constam no orçamento previsto da
União?).
Provavelmente, o
exercício da ética da responsabilidade seja frustrante porque não rende câmeras
de televisão; não abre espaços nos jornais; não alavanca a aprovação fácil de
paladinos da justiça que vendem a política como fé, esperança e imaginação,
caindo assim na simpatia popular! Para que imoralidade maior, mandando ao
esgoto a responsabilidade, de uma novela que glamouriza o crime com uma mulher
bonita como Juliana Paes?!