Quando a gente era
estudante do curso primário, aprendeu que no dia 7 de setembro de 1822 o
príncipe português dom Pedro, regente da colônia, estando em viagem de Santos,
no litoral paulista, para o Rio de Janeiro, deu no caminho de cara com o
carteiro do paço de São Cristóvão, que levava cartas de sua mulher, a princesa
Leopoldina e de seu conselheiro, o babão José Bonifácio de Andrada e Silva
recomendando, diante da situação, que se tomasse uma providência em relação ao
futuro do Brasil.
Com o tempo e a gente
saindo mais adiante e tomando conhecimento de outras histórias e geografias vai
se dando conta de que a coisa foi bem diferente. E essa história do Brasil
realmente é mesmo interessante e rica. E se a gente larga a juntar as peças aí
é que a coisa fica boa de ouvir e discutir em roda de conversa.
Na Parnaíba, uma das
mais importantes vilas da colônia no distante Piauí, havia um princípio de
baderna e já se sentia cheiro de carniça na esquina da rua Caramuru com Pinheiro
Machado. Alguns estudantes de colégios do centro da cidade e da avenida São
Sebastião já marchavam em direção ao Mirante, onde ficava o campus da
Universidade Federal.
Alguma coisa precisava
ser feita e logo, porque corria risco de ter depredação do patrimônio,
principalmente na praça da Graça e no Bar Carnaúba. Já havia tropa enfileirada inclusive
nas imediações da rua Itaúna, pronta pra abrir fogo em caso de alguém mais
afoito tentar invadir o gabinete do prefeito. O clima realmente era de muita
apreensão.
Contam hoje os
historiadores, esse pessoal da esquerda, os descontentes porque não pegaram uma
boquinha no governo de Pedro I, que ele fez toda aquela encenação no meio do
caminho, às margens do riacho do Ipiranga em São Paulo, com direito a sair na
internet, numa foto belíssima tirada pelo blogueiro Pedro Américo, que depois
de uma noitada e tanto na casa de uma tal de Domitila, que pelas fotos que a
gente viu era bem gordinha e feinha de dar dó. Com tanta mulher bonita no
Brasil, iguais essas da televisão e modelos, o príncipe achou graça justamente
naquela.
O príncipe, que segundo
seus biógrafos, era mais valente que siri dentro de uma lata ou Lampião quando
se acordava de ressaca de tiquira feita ali no Magu, nem pestanejou: terminou o
que estava fazendo, abotoou as calças, chamou seus puxa-sacos, asseclas, a
tropa de choque, os peemedebistas e petistas da comitiva pra uma conversa ao pé
da mangueira. Depois de ler as cartas e ouvir alguns deles, que de mão na boca
ainda tentavam falar alguma coisa, o príncipe ainda com um bafo de onça disse
que aquela situação era insustentável.
Mal se sustentando nas
pernas, procurando os óculos de sol que havia comprado na praia de Ubatuba, ali
onde o Clodovil tinha uma casa, chamou o carteiro e pagou uma descompostura daquelas
ali no meio de todo mundo. Não é de hoje que a corda só quebra do lado do mais
humilde funcionário público, aquele que cumpre fielmente seu dever. Os
puxa-sacos do PMDB e do PT caíram na gargalhada vendo o chefe dar um cagaço no
coitado do carteiro. Ele ficou ali roendo as unhas e assuntando toda aquela
presepada. Pensava consigo: um dia eles me pagam.
No futuro, dizia
consigo, vou atrasar a correspondência deles e fazer greve de não sei quantos
dias só pra ver eles pagando multa da conta de luz, de água e do carnê do
Paraíba!
Enquanto isso a
rapaziada da comitiva ainda continuava rachando o bico na risada. Teve um que,
devido ao sol forte chegou a providenciar um chapéu pro príncipe. Os
historiadores também contam que este chapéu, feito pelo pessoal da Ilha de
Santa Isabel, lá dos Tatus, foi comprado numa barraca do Piauí Sampa e seria
levado de presente pra princesa Leopoldina, uma alemã que mal falava com o
marido, quanto menos com a criadagem.
Passava o tempo todo
vendo televisão, principalmente a Ana Maria Braga e a novela das oito, Amor à
Vida. A coitada ficara no Rio de Janeiro agüentando aquele tal de José
Bonifácio, com aquela conversa comprida de mineiro. Um saco, aquele velho. O
chapéu era uma espécie de agrado, um mimo, pra ela passar um pano, esquecer as
escapulidas dele lá pras bandas de Santos.
Depois de ler as
cartas, rasgar algumas delas e cuspir longe, Pedro subiu no cavalo, ao que hoje
se sabe emprestado de um assecla que tinha uma portaria gorda no Palácio de São
Cristóvão, puxou a espada e procurou os óculos que estavam com outro assessor,
o de número três. Feito todo esse rito, chamaram o blogueiro Pedro Américo e
ordenaram que registrasse o grande momento. Agora estava realmente proclamada a
independência do Brasil. O carteiro ainda procurou saber com o príncipe como
era que ficava a questão da diária. Nem o príncipe nem ninguém da comitiva
falou mais nada.
Lá no Piauí, mais longe
que nem Timon, um tal de Simplício Dias da Silva e outros figurões, se meteu a
proclamar a independência do Brasil. Ora vejam! Saiu na porta de casa e chamou
a criadagem, as raparigas, os puxa-sacos e obrigou todo mundo a se ajoelhar nos
caroços de milho. Até hoje eu me questiono como é que naquele tempo, com as
comunicações geograficamente tão difíceis, pois não tinha telefone, nem e-mail,
facebook, as chamadas redes sociais, e a notícia chegou à praça da Graça em
pouco mais de um mês. Impressionante!
Pra vocês verem que a
fama da praça da Graça como ponto de fofoca não é de hoje! Quem desobedeceu foi
enterrado até a altura do pescoço e obrigado a assoviar o hino da Parnaíba
inteirinho. Muita gente não agüentou e pediu penico. Muitos morreram e ali
mesmo foram enterrados. Até hoje, acreditem, ainda tem formigueiro bem de frente
da matriz.
E deu tempo pra um tal
de Fidié subir de Oeiras, lá no Deus me livre, até aqui passando por cima de
paus e pedras e ainda tendo dado uma parada em Campo Maior de onde levou uma
pesada de carne de sol pra temperar o feijão de dona Maria. Só que não voltou
pra casa. Dona Maria, a prendada mulher do português, até hoje espera a tal
carne de sol. Mas lá em Campo Maior teve foi uma briga de cacete e de foice. Acabaram
foi quebrando a cabeça dele. Fidié foi preso e ainda perdeu a carne e um liquidificador
de segunda mão que havia comprado por vinte meréis lá na feira do troca-troca
em Teresina.
Em Santos, voltando pro
Rio de Janeiro a turma saiu cantando e comemorando pelo meio da campina o
grande feito do príncipe português. Uma independência feita assim depois de uma
farra de vinho e certamente muita mulher pelo meio onde certamente houve uma
farta distribuição de cargos e exigências de salários, comissões e outras
falcatruas não podia mesmo ter dado certo.
O Brasil está aí, verde
e amarelo, tem futebol, estádio novinho em folha pra Copa do Mundo de 2014,
carnaval, cheio de vícios políticos, molecagem de toda ordem, corrupção no meio
da canela. Ninguém acredita mais nas instituições e na autoridade, porque a
autoridade é a primeira a ser o mau exemplo, principalmente a classe política.
Não dá pra acreditar numa independência dessas!
Pádua Marques
E jornalista e Escritor