Outro dia parei pra
pensar como duas situações tão distantes no tempo e no espaço podem ser tão
próximas ao mesmo tempo. A primeira, a carreira do piloto de Fórmula 1, o
brasileiro Rubens Barrichello, atualmente aposentado e comentarista da Rede
Globo de Televisão. A segunda, a cidade de Parnaíba, na coroa do Piauí, que
noutra época foi uma das maiores do Nordeste, tinha prestígio político, tinha
indústria, tinha comércio, serviços, boas escolas, hospitais, um aeroporto que
não era somente pra enfeite e que hoje se deixou ultrapassar por algumas
cidades que nasceram a partir de um posto de gasolina.
Passada essa minha interpretação
dos dois casos me veio o momento de colocar em ordem as coisas. Pra vocês que
vem acompanhando e lendo meus artigos pode até parecer enfadonho esse negócio
de toda semana ficar falando mal de Parnaíba, dizendo que a coisa aqui não
anda, que os políticos são oportunistas, descompromissados e só pensam em se
dar bem logo após as eleições e que a classe empresarial não se modernizou. Os
meus leitores até podem ter razões pra deixarem de ler meus artigos. Mas eu
tenho certeza que muitos deles concordam com minhas opiniões.
Mas voltando ao
Barrichello, o piloto das pistas de Fórmula 1 e que todo mundo achava que seria
o sucessor natural de Ayrton Sena, este tem uma característica que combina
perfeitamente com a cidade piauiense e seu complexo de grandeza, que tendo
conseguido status perde a ambição de continuar crescendo. Rubinho passou pela
história do automobilismo mundial como um dos maiores azarões, pés-frios de que
se tem lembrança até a presente data. Bem diferente de seu conterrâneo, que
quando entrava na pista todo mundo sabia que era vitória na certa. E olhe que
muitas e muitas vezes Sena começava lá atrás sem a menor chance de vencer a
corrida.
E o Brasil inteiro ficava
aos domingos em frente à televisão esperando o Galvão Bueno e o Reginaldo Leme
falarem aquelas coisas todas. Em cada casa brasileira Ayrton Sena era feito um
irmão que estava participando daquelas competições, levando a nossa marca e
quando ele terminava a corrida vinha conduzindo a bandeira do Brasil e aí
tocava aquela música que fizeram única e exclusivamente pra ele e que era e é a
cara dele e só assenta com ele. Era aquele irmão que ia bem longe levar o nosso
nome de família, dizer pra eles que a gente podia não ter lá grandes coisas,
mas que tinha gana de chegar e ficar entre os grandes.
Mas Rubens Barrichello
sempre foi diferente. Nem dá pra falar onde está a diferença entre os dois
pilotos. Rubinho até onde todo mundo sabe é de família italiana, dessas
encravadas no centro de São Paulo, ali pelo bairro do Bexiga e adjacências.
Somente esta condição de ter um sobrenome italiano já lhe dá status dentro da
selva paulistana quando ganha fama por fazer alguma coisa, principalmente no
estrangeiro. Chegou ao circo da Fórmula 1 na carona de Sena. Ora, se com um
brasileiro fazendo todo aquele reboliço no meio dos gringos, imagine dois
brasileiros. Não iria ter pra ninguém. Era o que se imaginava.
Mas Rubinho foi uma das
maiores decepções pros brasileiros. Nem é bom lembrar e nem falar da lista
imensa de derrotas que sofreu em sua longa carreira. Nós brasileiros, quando
ele estava numa pista, a gente rezava pra que acabasse. Não a dele, mas a nossa
angústia. Angústia de ver todo mundo passando na frente dele e ele com aquela
cara dentro do carro achando que ainda tinha condições de vencer a corrida se
os outros pilotos quebrassem suas máquinas. Ficava ali como se os pneus do carro
tivessem colados com chicletes. Era coisa de irritar a qualquer um. Coisa de
fazer padre falar “diabo” com toda aquela lerdeza dele.
E a gente ficava ali
roendo as unhas, se coçando no sofá, indo não sei quantas vezes ao banheiro,
correndo até a cozinha escorrer no copo a última gota de café da garrafa
térmica ou à procura de alguma coisa pra mastigar, quem sabe um pedaço de pão
seco. Porque naquele momento era mais que um padecimento aquele nosso. Mal
comparando e, que Deus me perdoe, era parecido com a Via Sacra. E como era bom
quando acabava e a gente ficava sabendo, graças a Deus que ele estava vivo,
estava bem e que os outros haviam passado na frente dele. Porque se ele
ganhasse realmente ninguém nem poderia saber o que iria acontecer.
É o que anda
acontecendo faz tempo com a Parnaíba. Segundo um documento divulgado
recentemente com a autoridade da UNESCO, a cidade estava no ano 2000 na décima
colocação entre as piauienses com maior IDH, o Índice de Desenvolvimento
Humano. Pelo tempo passado e as sucessivas intervenções era pra estar numa
posição melhor. Agora em 2013 o mesmo documento aponta que pouca coisa mudou.
Parnaíba não está entre as três primeiras, mas na quarta colocação, portanto
fora do pódio. E pódio até onde eu e todo mundo sabe só tem três posições. Ninguém
sabe se foi a Parnaíba que ensinou ao Rubinho Barrichello ou se foi o
contrário.
Pádua Marques
É jornalista e escritor