18 de nov. de 2023

A política brasileira numa perspectiva estética – Parte 2

Prof. Dr. Geraldo Filho – UFDPar (17/11/23)

 

Como prometi, continuarei o artigo anterior fazendo as duas questões finais da estética à dimensão política da vida brasileira, inquirindo pela beleza (o belo) e a justiça (o justo), que naturalmente fazem parte da experiência humana na sua integridade.

 

Na estética o belo não se restringe à beleza plástica das formas, que remete ao equilíbrio harmônico da imagem e a admiração que ela desperta no espectador, como na beleza de um quadro, numa paisagem magnífica ou em um corpo escultural. O belo também se manifesta nas relações humanas envolvidas pela política, como altruísmo dos protagonistas (políticos profissionais) ou como seu oposto (o feio, o repugnante): o egoísmo compulsivo.

 

O altruísmo é um instinto/qualidade encontrado em diversas espécies biológicas, exemplificado pelo individuo que se sacrifica ao se colocar em risco de vida para proteger o grupo de origem (como um búfalo, que ao atravessar um rio toma a frente da manada para atrair possíveis perigos, enquanto ela passa em relativa segurança).

 

A princípio se poderia imaginar que esse animal é um herói tolo, mas, pense de novo! A explicação por trás do gesto altruísta pode ser também egoísta: o búfalo perdeu a vida para garantir a sobrevivência e propagação dos parentes (linhagens genéticas) que estão no grupo.

 

Entre os humanos o altruísmo adquire outro nível de qualidade (este é considerado o verdadeiro altruísmo por Sir Roger Scruton), pois sua expressão supera o limite das linhagens genéticas e se estende a milhares de pessoas desconhecidas para quem se faz alguma coisa em seu favor. É o caso do político profissional!

 

Um indivíduo que voluntariamente se candidata para representar pessoas ou é motivado pela vocação, ou é estimulado pela vaidade ou é simplesmente um psicopata espertalhão, que encontra na possibilidade de manipular os corações e as mentes dos ingênuos a oportunidade de dilapidar o dinheiro público arrecadado pelos impostos. Os que pertencem as duas primeiras categorias, por razões diferentes, tendem a fazer coisas boas e são admirados por isso (o belo)! Os da terceira categoria suas ações levam ao desastre de uma sociedade!

 

Tanto vocacionados como vaidosos também têm de pensar em si e em suas famílias, afinal político profissional não significa voto de pobreza! Os vocacionados procuram promover o bem comum porque naturalmente são assim! Os vaidosos procuram fazer o mesmo porque adoram a admiração, os aplausos e os holofotes! Já os espertalhões sua motivação é o egoísmo compulsivo: o aparente bem comum que promovem traz embutido cálculo de poder e corrupção, que converte os possíveis benefícios em escravização dos indivíduos clientes aos programas de assistência social (bolsas dos mais diversos tipos, cotas de minorias, etc).

 

A terceira categoria é a que predomina no Brasil desde o fim do Período Militar! Não é que antes do último ciclo militar (1964/85) não houvesse psicopatas espertalhões participando da política nacional, sempre existiram, Dom Pedro II já os denunciava no Império! Porém, as corrupções aconteciam na máquina administrativa pública de um Estado pequeno e relativamente barato para a população. O problema foi que do Período Vargas (1930/45; 1951/54) em diante o Estado brasileiro aumentou progressivamente de tamanho, acelerando durante o Período Militar!

 

A profusão de políticas públicas de assistência (educação, saúde e previdência) e a criação de empresas estatais federais (da Petrobrás às diversas estatais de energia, comunicações, aviação, portos, ferrovias, bancos, etc., que foram espelhadas pelos governos estaduais) sufocaram a sociedade civil, criando um ente Estatal gigantesco, com ramificações na vida cotidiana dos cidadãos. Esse é o contexto de uma máquina administrativa pública favorável à disseminação dos psicopatas espertalhões, devido ao enorme tamanho se multiplicam as oportunidades para a manifestação do egoísmo compulsivo (o feio), pois eles pouco se incomodam se o dinheiro desviado foi retirado de mais de 200 milhões de almas na forma de impostos! A cultura popular traduziu a essência da administração pública na frase: “Criar dificuldades para vender facilidades”!

 

No momento em que escrevo, o governo federal do PT anulou decreto que permitia a negociação direta entre empresas e empregados sobre trabalho nos feriados e finais de semana, condicionando os acordos a convenções por categorias (sindicatos), em um claro retrocesso na liberdade permitida pela reforma trabalhista recente (governo Michel Temer)! Mais um exemplo de interferência na autonomia da sociedade civil!

 

Quanto ao justo, na perspectiva estética a justiça não se circunscreve às leis do legislativo e a avaliação da sua aplicabilidade técnica pelo judiciário, portanto ela transcende o aspecto formal e pergunta sobre o sentimento de segurança sobre a vida e o patrimônio de cada indivíduo da sociedade brasileira ao longo dos anos. Não interessa as baboseiras hermenêuticas (interpretativas) intermináveis de advogados/juristas que falam e escrevem difícil, defendendo teses abstratas que ninguém entende e eles apareçam como donos de saber e erudição (aprendi que é o contrário, quem fala e escreve assim tem má intenção: ou nada sabe ou quer enganar os outros!).

 

O que interessa é saber se os brasileiros se sentem efetivamente seguros a respeito da integridade física dos seus corpos e a certeza da posse do patrimônio conquistado pelo trabalho! Esse sentimento está na raiz da tradição política conservadora e liberal inglesa, que concebeu o direito à vida e à propriedade como direitos naturais, que nascem com o indivíduo e têm relação direta com sua rotina diária; além disso, a mesma tradição britânica forjou os partidos políticos modernos como se conhece.

 

Portanto, a vida e a propriedade são direitos consolidados na tradição e nos costumes de dezenas de gerações passadas, não surgiram da abstração utópica de nenhum político legislador, de um filósofo ou um jurista! Os direitos naturais da tradição são a expressão evoluída do justo.

 

Quando se compara com o Brasil atual o justo da perspectiva estética é vergonhosamente violentado e vilipendiado pela dimensão política e sua extensão jurídica (pois os tribunais superiores são constituídos por nomeação política, como o STF)! Assim, a sociedade civil assiste paralisada e apavorada aquilo que está escrito na Constituição não valer mais nada! O direito à vida todos os dias é massacrado por criminosos que matam e ferem (física e psicologicamente) e têm a certeza de que sairão impunes ou, se forem apenados, dentro de poucos anos voltam para a sociedade! O direito à propriedade sendo relativizado e posto à prova, aquilo que você achava que era seu pode não ser, pois o presidente do governo federal do PT disse que roubo de celular é uma bobagem, “são garotos querendo tomar uma cervejinha”! E mais, se você achava que sua casa, sítio, fazenda, terreno eram seus, talvez você esteja equivocado, pois segundo a “nova interpretação” do Supremo para o Marco Temporal de 1988, caso apareçam índios afirmando que as terras eram dos ancestrais você ficará sem suas propriedades! Em termos estéticos, isso é o injusto, é a iniquidade!

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