O advogado, professor, ex-governador e ex-senador Chagas Rodrigues faria 100 anos hoje. Ele nasceu em 8 de novembro de 1922, em Parnaíba, e entrou para a história como um dos maiores governadores do Piauí.
Chagas Rodrigues |
Foi o governador que implantou o salário mínimo no serviço público estadual e preparou o Piauí para o futuro.
Com ele o Piauí conheceu a era do planejamento e também um dos homens públicos mais dignos de sua história.
Chagas Rodrigues faleceu em 7 de fevereiro de 2009, em Brasília.
Sua biografia foi escrita pelo jornalista Kenard Kruel e publicada em 2018 pela Gráfica do Senado.
Agora está saindo um novo livro sobre ele, intitulado Chagas Rodrigues e a Hidrelétrica de Boa Esperança, escrito pelo advogado Reginaldo Furtado, que foi seu secretário particular.
Quando Chagas Rodrigues fez 80 anos, em 2002, escrevi no jornal Diário do Povo uma reportagem especial de página inteira sobre a sua trajetória política.
O texto é o que se segue:
Nos tempos da brilhantina
O ex-governador e ex-senador Chagas Rodrigues, o político mais popular do Piauí à época em que governou o Estado, entre o final dos anos 50 e o início dos anos 60, completa hoje 80 anos exilado da vida pública.
Nascido em Parnaíba, em 8 de novembro de 1922, ele conquistou seu primeiro mandato eletivo (deputado federal) em 1950, aos 28 anos de idade.
Com oratória vibrante a empolgar multidões, jovem e bem-vestido, Chagas Rodrigues era uma elegância nos palanques. Nas eleições de 1958, quando pleiteava a reeleição à Câmara Federal, um acidente automobilístico mudou sua vida e a história do Piauí. Naquele ano, inesperadamente elegeu-se governador.
Chegando ao poder, aos 36 anos, Chagas fez um governo popular e reformador. Seu período administrativo coincidiu com o surto desenvolvimentista do governo Juscelino Kubitschek.
O Piauí incorporou o espírito nacional de realizações, simbolizado no slogan da Era JK – 50 anos em 5 – e operou muitas transformações.
No comando dessas mudanças, Chagas implantou a espinha dorsal da administração pública estadual, com a criação de vários órgãos de infraestrutura.
As medidas por ele adotadas implementaram a participação e a importância do Estado na economia.
Segundo os economistas Agenor de Sousa Martins, Ageslau José de Sousa Martins, Antônio José Pereira, Francisca Amélia de Carvalho Sá e Freitas e Maria das Graças Ferreira Lima, técnicos da Fundação Cepro, o estado teve um direcionamento mais significativo rumo à economia a partir do Governo Chagas Rodrigues.
Em artigo intitulado “O Piauí na Economia Nacional”, publicado na revista Carta Cepro (Teresina, vol. 8, número 2 – julho/dezembro de 1982), os técnicos sustentam que as ações anteriores de governos locais, fundamentalmente burocráticas, deram lugar a várias ações de substancial conteúdo econômico.
Entre os órgãos criados no Governo Chagas Rodrigues estão a Agespisa, a Cepisa e a Telepisa. Chagas lançou a campanha pela Barragem de Boa Esperança. Também promoveu avanços na área social.
O salário mínimo para o servidor estadual foi implantado nesse período, quando foi criado, também, o Serviço Social do Estado (Serse).
O órgão marcou presença na assistência aos pobres, junto com a Igreja Católica, sobretudo na enchente de 1960, que alagou Teresina. Todo o trabalho foi coordenado pela mulher do governador, dona Maria do Carmo.
Reprodução Diário do Povo, de 8 de novembro de 2002. |
Bossa Nova e Rock and Roll
No Governo Chagas Rodrigues, o Brasil vivia a Época de Ouro do Rádio, o principal veículo de comunicação de massa.
A Bossa Nova ganhava as paradas de sucesso, com suas melodias suaves e harmonias mais sofisticadas, nas vozes de Elizeth Cardoso (Canção do amor demais), Tom Jobim, Vinícius de Moraes e João Gilberto (Chega de saudade).
Ao mesmo tempo, um cantor norte-americano havia se transformado em novo ídolo da juventude mundial. Era Elvis Presley, com sua guitarra vibrante, requebros, topete com brilhantina, largas costeletas e blusão de couro dominando as paradas do mundo inteiro.
À maneira de seu ídolo, nos embalos de sábado à noite os rapazes da época não dispensavam a brilhantina, para deixar o cabelo bem alinhado e reluzente.
Nas ondas do rádio – Afinado com o seu tempo, o governador Chagas Rodrigues não hesitou em usar politicamente o grande meio de comunicação da época, o rádio.
Por inspiração sua, foi instalada a Rádio Clube de Teresina, onde o governador tinha o seu próprio programa.
Uma vez por semana, ele apresentava o programa “Falando com o povo”, de arrebatadora audiência.
Chagas apresentava as realizações de seu governo, divulgava suas ideias políticas, comentava os assuntos da semana e respondia às cartas dos ouvintes.
Governador por acidente
Chagas Rodrigues chegou ao Governo do Piauí por acidente, literalmente. A campanha eleitoral para a sucessão do general Gayoso e Almendra (PSD) no Governo do Estado estava na reta final quando, a 4 de setembro de 1958, um desastre envolvendo dois carros matou o advogado Demerval Lobão, candidato a governador, e o deputado federal Marcos Parente, candidato a senador, pelo PTB.
Os candidatos viajavam para comícios em Água Branca e São Pedro do Piauí. Rodaram apenas 14 quilômetros, na BR-316, ainda em construção.
A poeira encobria o céu. O carro em que viajavam bateu violentamente numa caçamba do DNER carregada de operários que trabalhavam na construção da estrada.
No desastre, morreram os dois candidatos, mais três assessores deles e nove operários.
A tragédia abalou o mundo político e social do Piauí e entrou para a história como “Acidente da Cruz do Cassaco”.
O acontecimento está relatado em detalhes em meu livro “O Piauí no Século 20 – 100 fatos que marcaram o Estado”.
Desfalcada inesperada e tragicamente de seus candidatos majoritários, a oposição se refez do choque e explorou politicamente o clima de comoção que se abateu sobre os piauienses.
Os candidatos mortos foram imediatamente substituídos pelo jovem deputado federal Chagas Rodrigues (candidato ao governo) e pelo comerciante Joaquim Parente, que morava no Rio de Janeiro, mas era irmão de Marcos Parente.
Os dois foram eleitos com consagradora votação.
Cassação, anistia e exilio
Ao deixar o Governo do Estado, em 1962, Chagas Rodrigues candidatou-se a senador e a deputado federal, como permitia a legislação da época.
Tão logo passou o poder ao seu vice, Tibério Nunes (UDN), foi passado para trás pelo sucessor, que se compôs com Petrônio Portella, ex-prefeito de Teresina e candidato a governador pela coligação UDN/PSD.
Aos trancos e barrancos, o ex-governador conseguiu eleger-se para a Câmara Federal.
Em 1966, reelegeu-se para novo mandato na Câmara, não chegando a concluí-lo. Foi cassado pelo golpe militar de 64, como subversivo, com base no Ato Institucional nº 5. Perdeu os diretos políticos por dez anos.
A volta por cima – Impedido de militar na política, exerceu a profissão de professor universitário em Brasília. Voltou aos palanques em 1982, como candidato a senador pelo PMDB.
Foi o mais votado, mas perdeu a eleição por causa da vinculação de votos e da sublegenda.
Nas eleições seguintes, em 1986, reconquistou nas urnas um mandato popular (senador).
Na Constituinte – Como senador, atuou com destaque como constituinte. Com Fernando Henrique Cardoso, Mário Covas, José Serra, Rita Camata, Myriam Portella, Paulo Silva e outros parlamentares brasileiros formou o bloco progressista na Constituinte, assegurando conquistas sociais e avanços políticos na Constituição de 1988.
Ainda no Senado, foi vice-presidente, titular da Comissão de Constituição e Justiça e um dos parlamentares mais ativos.
Conseguiu Nota 10 no Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).
Acompanhou os dissidentes do PMDB na formação do PSDB, em 1989.
Ao perder a reeleição para o Senado, em 1994, e com problemas de saúde, decidiu abandonar a política, recusando, inclusive, um convite do presidente Fernando Henrique Cardoso, seu amigo, para trabalhar no Palácio do Planalto.
Modernização e assistência social
O Grande Dicionário Histórico-Biográfico Piauiense (1549-1977), do escritor Wilson Carvalho Gonçalves, faz a seguinte síntese das realizações do governo Chagas Rodrigues:
“Modernização da administração do Estado, criando um órgão de planejamento (a Codese, que, mais tarde, se transformaria na Secretaria de Planejamento). Criação de várias sociedades de economia mista. Instituição de uma entidade de assistência, estudos e planejamento dos problemas sociais do Piauí – Serse. Ampliação da rede de ensino. Dinamização do poder energético do Piauí, criando a Coheb – Companhia Hidrelétrica de Boa Esperança. Construção de estradas pioneiras no Estado, como a Rodovia Sul do Piauí, ligando Oeiras a Simplício Mendes. Outros atos e fatos registrados em sua administração: criação de Escolas Normais e Colégios de 2º grau no interior. Construção e reforma de prédios escolares. Criação da Escola de Enfermagem. Incentivo à agricultura, indústria e pecuária, criando a Agrinpisa. Criação da Agespisa, da Cepisa e do Iapep. Reforma judiciária no Estado. Concessão do salário mínimo a todos os servidores públicos. Ampliação dos serviços de saúde pública, construindo os hospitais de São Raimundo Nonato e Piripiri. Criação dos municípios de Francisco Santos, Ipiranga, Joaquim Pires, São o Julião, Avelino Lopes, Francinópolis, Nossa Senhora dos Remédios, Rio Grande do Piauí, Várzea Grande, Marcos Parente, Novo Oriente e Aroazes.”
Por: Zózimo Tavares Mendes
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