28 de dez. de 2016

Olhando para frente... que venha 2017! (27/12/2016)

Prof. Dr. Geraldo Filho - UFPI

O exercício da ciência, em regra, tem como resultado para os verdadeiros praticantes um olhar frio e cético quanto aos vários aspectos da vida, principalmente quando interrogam sobre sua origem e significado, no plano individual ou coletivo! Como na maioria das vezes, sobre isso há um lado negativo e um positivo a considerar.
Em relação ao primeiro, o olhar frio e cético devassa e fulmina as utopias e as ilusões correspondentes, que de maneira irresponsável jogam com as expectativas e a ansiedade das pessoas, que cotidianamente lutam pela realização dos sonhos, assoladas que são pela velocidade do tempo exíguo de uma vida que passa célere!
Com efeito, a visão em preto e branco afronta o colorido das utopias políticas e religiosas fáceis, que prometem mundos perfeitos nos quais as injustiças, as desigualdades, os preconceitos e os pecados seriam definitivamente expurgados e, como consequência, um novo homem emergiria purificado.
Ora, como sabemos – ou pelo menos deveríamos saber – nunca houve sociedade perfeita! Por isso, o olhar objetivo e gélido deveria imunizar as pessoas contra tentações utópicas, fazendo com que vissem o mundo como “ele é” e não como “desejariam que ele fosse”.
Poderia citar vários exemplos para ilustrar o fracasso dos sonhos salvacionistas que embalaram muitos povos, sobretudo os de natureza política, porém ficarei com o Brasil, que renitentemente é vítima desses aproveitadores ilusionistas.
É tempo de aprender que foi um crime o que se cometeu contra Pedro II e contra o país – crime pelo qual pagamos até hoje – quando se proclamou irresponsavelmente a república sem base social preparada para exercer a vida democrática, que exige, para dizer o mínimo, um povo educado para o respeito com a coisa pública! A monarquia parlamentar do Império iria se reformar – como já estava ocorrendo – e o Brasil tomaria o caminho que foi trilhado por séculos pela Inglaterra, o que garantiria um futuro de estabilidade. No entanto, esse processo foi frustrado pelo radicalismo idealista dos republicanos jacobinos brasileiros do fim do século XIX, que é bom relembrar, foram responsáveis (os livros de história não dizem!) por jogar milhões de escravos negros na pobreza econômica – problema social que ainda se arrasta – ao forçarem, pouco antes da Proclamação (1889), a Abolição (1888), sem um programa de inserção dessas massas em um mercado livre (como uma reforma agrária que deveria ter sido realizada há época – e que era cogitada e defendida pela Princesa Izabel!).
É tempo de aprender que esse monstro estatal que atrapalha a vida dos brasileiros começou a ser construído com Getúlio Vargas, em 1930, que iniciou a relação promiscua entre empresas e governo federal, gestando uma mentalidade empresarial dependente do estado, que dá as costas para a sociedade civil; pois é sempre melhor trabalhar para governos (onde se pode corromper licitações e superfaturar tudo!) do que disputar clientes no mercado privado, uma das razões pelas quais os empréstimos bancários são tão caros para o cidadão comum e o preço dos imóveis para habitação exorbitantes (pois são os governos que monopolizam a maior parte dos financiamentos do sistema financeiro e a capacidade de produção instalada das empreiteiras!).
É tempo de aprender que o período militar brasileiro (1964-85), apesar do nacional-desenvolvimentismo estatizante – um modelo econômico míope em relação ao mercado liberal de livre-concorrência e integração internacional – foi responsável pela modernização das instituições brasileiras em vários níveis, sobretudo a infraestrutura. E mais, que os que dizem ter lutado pela democracia há época – movimentos comunistas abrigados em várias siglas: PCdoB, VAR-Palmares, ANL, Colina, MR-8, etc. – lutavam e eram financiados e treinados por ditaduras comunistas como URSS, China e Cuba, cujo modelo visavam implantar no país.
É tempo de aprender que a partir de 2003 até 2016 o Brasil foi tomado por um projeto de poder de um partido político que reciclou ideias comunistas apenas na superfície, para se tornar palatável para os segmentos médios e altos da sociedade, mas na essência tinha a mesma concepção de mundo dos comunistas dos anos 60. Basta ver o arco de aliança política construído: todo composto por ditaduras ou países com tendência esquerdista! Aproveitaram um oportunista líder sindical, com histórico de retirante do sertão nordestino, semianalfabeto e o venderam com excelente marketing eleitoral, transfigurado numa caricatura que deveria representar o típico brasileiro médio: o malandro que deu certo (“Pedro Malasartes”; “Macunaima”). Só não imaginaram que a autocorrupção do líder salvador pudesse corromper todo o partido e o sonho de continuidade no poder.
Portanto, o olhar frio e cético, em preto e branco, ou objetivo e gélido, resultado da prática permanente da ciência “hard”, poderia me deixar infeliz e desencantado. Esse estado de espírito, aliás, faria com que compartilhasse o humor de milhões de brasileiros que repetem sem titubear que o país vai mal, está em crise, está afundando... antes de recitarem a ladainha de escândalos dos últimos anos desde o mensalão, o petrolão e o “impeachment” de Dilma Roussef, etc. Surpreendo-me, negativamente, com professores universitários que dão chiliques quando se menciona esses escândalos (certamente porque votaram e apoiaram seus protagonistas!) e tal qual “maria-loucas” ficam histéricos ao se abordar a PEC do controle dos gastos públicos e a PEC da reforma da previdência; o que comprova que há professores universitários e “professores universitários cientistas (pesquisadores)”.
No entanto, o tal olhar frio e cético tem um lado positivo! Pois é dele que vem a inspiração para descobrir luz na escuridão, partindo de algo que está à vista de todos! Ironicamente, apesar das mazelas (já detalho um pouco mais) e do pessimismo em geral, o Brasil progressivamente vem aumentando a expectativa de vida da população numa velocidade impressionante! Colegas economistas cunharam frase que maravilhosamente flagra a ironia: “O Brasil envelheceu sem ficar rico!”.
De uma forma absolutamente objetiva e gélida, preto e branco: apesar – e ponha apesar nisso – da saúde horrorosa proporcionada pelo sistema público para a maioria da população; apesar da educação péssima do sistema público e privado que coloca os estudantes brasileiros nas últimas colocações no exame internacional PISA (que reúne 70 países: provas de leitura, matemática e ciências); apesar de tudo isso, o pouco que a saúde e a educação fizeram ao longo desses anos conseguiu um impacto que avalio como animador e motivo de esperanças.
Os programas de acompanhamento pré-natal, programas de vacinação, programas contra DSTs, programas de saúde da família, hospitais públicos de referência, prontos-socorros, postos de saúde, etc... deram longevidade e qualidade de vida para os brasileiros que, como consequência, criaram um novo tipo de problema: a necessidade de reformar a previdência, simplesmente porque os brasileiros estão vivendo mais! Irônico, não?!
Por outro lado, um dos efeitos de uma população escolarizada em todo o mundo é a drástica redução da quantidade de filhos por família. Assim, apesar da deficiência crônica do sistema de educação, a taxa de natalidade vem diminuindo vertiginosamente, invertendo-se a pirâmide etária, ficando a base cada vez mais estreita e o topo cada vez mais largo. Aqui também se criou um novo tipo de problema, pois o número menor de jovens diminui o número de contribuintes que financiarão a previdência: reforçando a necessidade da reforma assinalada no parágrafo anterior. Nova ironia, concordam?!
Portanto, antes de imaginar que o Brasil vive um inferno de desespero e ficar deprimido – e não nego que tenhamos grandes dificuldades, como o desemprego e violência herdados após 13,5 anos de demagogia populista de esquerda – tente um exercício de distanciamento das paixões (frieza e objetividade!) e olhe o país com mais compaixão e boa vontade, observe que apesar dos retrocessos aqui e ali as instituições lentamente se aperfeiçoam; é tudo aquilo do que elas precisam, tempo para envelhecer e melhorar, sem o risco de aventureiros oportunistas “salvadores da pátria”. Feliz 2017!

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