A morte na semana
passada de uma criança de dez anos por policiais militares, moradora no morro
do Alemão no Rio de Janeiro, filha de piauienses, é neste momento de
turbulência apenas mais uma brasa daquelas bem pequenininhas na imensa, na birruda, na desse tantão assim, da fogueira em que está queimando faz tempo o
governo da presidente Dilma Rousseff e por extensão muitos, se não todos, os
governos estaduais com suas incompetências e dissimulações. A coisa está
ficando insustentável.
Eduardo de Jesus
Ferreira, pelo que se sabe, era um menino igual a tantos outros de sua idade.
Ele e seus pais, o ajudante de pedreiro José Maria Ferreira e a dona de casa
Teresinha Ferreira de Sousa e a irmã Patrícia, de 18 anos, tiveram a infelicidade
de morar num dos lugares mais desgraçados pra se viver atualmente em todo o
mundo o Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. Aquele lugar, infestado de
traficantes e bocas de fumo dá sentido ao que é hoje o Brasil e como o setor de
segurança trabalha.
Existem dois lugares,
onde é impossível de se imaginar dentro da civilização moderna, uma convivência
pacífica e tranquila no mundo, o Oriente Médio, ali depois da Turquia entrando
um pouco mais pra dentro e o Rio de Janeiro, na América do Sul, Brasil. Estes
dois lugares são o retrato do que se transformou a sociedade sem leis e sem
governos, a materialização da anarquia e a falta de autoridade, a ausência ou a
ineficiência do Estado e de suas leis. Vamos dizer assim pra não encompridar
conversa.
Agora, depois de toda a
comoção do enterro do menino em Corrente, terra de seus pais, a vida segue como
se não houvesse acontecido nada. No Rio de Janeiro, onde tem um governador
chamado Pezão, por aí você tira, a polícia encontrou um jeito simples de manobrar
a opinião pública e desarmar os ânimos. Mandou pra bem longe, mas bem longe
mesmo e com todas as despesas pagas, de avião e tudo, a família de Eduardo de
Jesus. É uma forma de evitar mais incidentes e ao mesmo tempo ganhar tempo pra
certamente manobrar provas.
A família de Eduardo é
pobre e sem instrução, mal sabe falar, não tem um filho de Deus ou um filho da
puta que a defenda. Nessa altura dos fatos não se tem pelo menos notícia de que
alguém ligado à defesa dos Direitos Humanos tenha se mostrado pra apoiar seu Zé
Maria e dona Teresinha. Fosse um artista, jogador de futebol, parente próximo
ou até mesmo distante de algum político a coisa seria diferente. Certamente as
investigações já estariam correndo soltas e os canais de televisão vinte e
quatro horas dando tomadas.
E vendo passarem todos
esses episódios na nossa frente lembro que essa semana ter encontrado numa fila
de banco meu querido amigo jornalista Mário Meireles. Sempre com aquela calma
de voz e aquele humor muito sutil só dele. E naquela conversa boa embora dentro daquela
agência pequenininha da praça da Graça ele me disse, assim quase sussurrando
entre um intervalo e outro: ainda vai morrer muita gente.
A princípio entendi ele
estar falando sobre esta questão do Rio de Janeiro envolvendo uma criança filha
de piauienses. Mas depois, já fora daquela fila insuportável e do atendimento
mais demorado ainda, foi que me dei conta de que Mário Meireles falava do
mundo. O mundo com suas deformações, sua falta de governos e de leis, o império
da corrupção dominando tudo, principalmente no Brasil e o estado e as sua
instituições sendo levados pra dentro de um enorme buraco ou tangido pelo vento
pra uma enorme fogueira, igual aqueles tanques de combustíveis que estão
queimando até hoje em Santos.
Por Pádua Marques
Jornalista e Escritor
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