O Brasil está
doente! Mesmo com o diagnóstico somos incapazes de cuidar do enfermo. O país
está na UTI, literalmente! Doenças endêmicas como corrupção, violência,
miséria, falta de educação de qualidade, saúde precária, ambiente natural sendo
degradado sem nenhuma preocupação com o futuro, jovens lançados à própria sorte
da barbárie imposta pelo tráfico e consumo de drogas, dentre outras mazelas que
implicam na nossa qualidade de vida.
Saúde e qualidade de vida são
dois temas estreitamente relacionados, fato que podemos reconhecer no nosso
cotidiano e com o qual pesquisadores e cientistas concordam inteiramente. Isto
é, a saúde contribui para melhorar a qualidade de vida e esta é fundamental
para que um indivíduo ou comunidade tenha saúde.
A propósito,
fazendo um recorte para o setor de saúde pública brasileiro, pode-se avaliar o
quanto os nossos gestores e a sociedade enfrentam (= omitem-se) a realidade
cruel experimentada por aqueles que necessitam de atendimento médico país
afora, especialmente os mais desprotegidos.
Muito
frequentemente vemos notícias de erros médicos, filas intermináveis, corrupção,
falta de ética profissional, estrutura inadequada, desperdício de dinheiro
público em obras que deviam funcionar para melhorar o atendimento, enfim,
situações que levam a maioria do povo brasileiro a amargar a vergonhosa e
humilhante fila de espera por atendimento, isso quando resiste...
O governo, a
partir de pressões da sociedade e da própria realidade caótica do setor,
resolveu agir. Para o Ministério da Saúde o problema é que os médicos
brasileiros não querem trabalhar nas periferias, nem nas cidades mais pobres. A
solução foi encontrada: mandar médicos para esses “guetos”. Caso os nossos
compatriotas não queiram, contratem-se médicos estrangeiros. Simples assim!
O governo
federal assinou termo de cooperação com a Organização Panamericana de Saúde
(OPAS) para contratar 4.000 médicos cubanos. Os profissionais serão alocados em
parte das 701 cidades mais carentes em serviços de saúde. O valor total do
acordo com a OPAS é de 511 milhões de reais até fevereiro de 2014. Cabe aqui uma indagação: essa medida resolve o problema de saúde no
Brasil? Pois assim é que se anuncia. Há quem diga que não e eu faço parte desse
enorme contingente.
A exemplo, colocar
um médico cubano no Posto de Saúde do bairro Sabiazal, em Parnaíba, vai trazer
saúde para aquela comunidade carente e sofrida? Ao juízo de qualquer pessoa sã
é preciso muito mais. Em que condições esse profissional atuaria? Com que
recursos pode contar? Quem são e como vivem esses brasileiros?
Ora,
convenhamos, o “buraco é mais embaixo”.
Ter médico não é garantia de um sistema de saúde operante e de qualidade. A
discussão que gravita na ordem do dia é se deve ou não contratar médicos
cubanos. Parece estratégico. Sim, pois não se discute a essência da questão que
é o funcionamento do Sistema Único de Saúde, o SUS, de forma integrado e com
qualidade.
A Carta de Ottawa - um dos
documentos mais importantes que se produziram no cenário mundial sobre o tema
da saúde e qualidade de vida - afirma que são recursos indispensáveis para se
ter saúde: paz, renda, habitação, educação, alimentação adequada, ambiente saudável,
recursos, sustentáveis, equidade e justiça social.
Isto implica no entendimento de
que a saúde não é nem uma conquista, nem uma responsabilidade exclusiva do
setor saúde. Ela é o resultado de um conjunto de fatores sociais, econômicos,
políticos e culturais, coletivos e individuais, que se combinam, de forma
particular, em cada sociedade e em conjunturas específicas, daí resultando
sociedades mais ou menos saudáveis.
Estamos diante
de um impasse que atende aos interesses de quem bolou essa ideia fabulosa. Antes
mesmo de os médicos cubanos desembarcarem em território nacional para atuar no
interior do país o Ministério Público do Trabalho prepara questionamento
judicial que pode resultar em demandas que vão em direção contraria ao desenho
do governo federal, enquanto entidades de classe anunciam que vão recorrer ao
Supremo Tribunal Federal (STF) alegando inconstitucionalidade do
programa.
Os médicos brasileiros estão batendo de frente com a decisão do governo,
alegam diversas razões para contestar a medida, mas uma em particular me chama
a atenção, eles dizem “seria uma medida
saudável se não fosse eleitoreira”, pois o sistema de saúde não será
reformulado, ou seja, vem o profissional para trabalhar em postos de saúde e
hospitais sem que se revejam as condições para promover um atendimento com
dignidade a quem precisa dos serviços.
Poderiam os “iluminados” ao
menos perguntar ao povo que tipo de saúde que se deseja?
(*) Fernando Gomes, sociólogo, cidadão,
eleitor e contribuinte parnaibano.
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