José Diogo dos Santos Rosa, de 6 anos, não tem a menor ideia sobre o significado do Dia da Criança. Ele não anda, se alimenta somente por sonda e enxerga imagens distorcidas. Também tem paralisia cerebral parcial. Mas ouve perfeitamente, o que lhe permite agitar braços e pernas na tentativa de acompanhar o ritmo da música no colo do cabeleireiro Francisco Wellington da Silva, de 42 anos. Ex-travesti, Léo, como é chamado, assumiu o papel de “mãe” de José Diogo. E briga na Justiça para conseguir a guarda definitiva do menino.
Léo divide os cuidados exigidos por José Diogo com o mecânico William Neri Ferreira, de 42 anos. Os dois estão juntos há 17 anos e planejam legalizar a união homoafetiva assim que conseguirem adotar a criança. A expectativa é a de que a decisão da Vara da Infância e da Juventude saia até o fim do ano. Se for favorável ao casal, representará a primeira sentença desse tipo em Minas.
Acaso
“O pai desempregado e a mãe, prostituta, não davam conta ou não queriam assumir a criação do filho e transformaram a existência da criança em um martírio”, diz o cabeleireiro. Segundo ele, os pais biológicos estão vivos e se separaram. O paradeiro deles é ignorado.
Léo se tornou personagem dessa história depois de, sensibilizado com o fato de o garoto não tomar banho nem se alimentar direito, aceitar tomar conta do bebê por algum tempo. “Na época, eu era travesti e passava o dia inteiro vestido de mulher, com cabelos longos e roupas caras. De repente, tudo mudou. Cuidar daquela criança parecia uma missão”, diz. “Passei a carregá-la por todos os lugares. Assumi o papel de mãe”.
União vigiada por olhares preconceituosos
Apesar da aprovação de vários parentes, a união do mecânico com o cabelereiro sempre foi marcada por olhares preconceituosos. Eles admitem que o preconceito dificulta muito a vida em comum. “Eu deixei de ser travesti há dois anos por causa do Diogo”, recorda Francisco Wellington.
“Eu saia, ou ia levar o menino para a escola, e percebia que as pessoas ficavam me olhando e comentando sobre aquele homem vestido de mulher, com uma criança excepcional no colo. Eu me esforçava para parecer mulher. Cheguei a colocar uma tatuagem com o nome do William no meu pescoço, para tentar disfarçar o meu “gogó″ (pomo de Adão) que é muito destacado. Tudo pelo desejo de parecer mulher”.
Atualmente o cabelereiro e o mecânico não imaginam outra vida sem a presença de Diogo, segundo afirmam. Os projetos de viagens e de passeios de fins de semana são feitos com a intenção de que a criança experimente a sensação de viver em lugares diferentes. O cabelereiro acredita que esses momentos compensam dias e dias de dificuldades para cuidar do menino.
Lembra que, “um dia, quando levei o Diogo a um pediatra, o médico ficou assustado ao ver que eu era um travesti que carregava no colo uma criança deficiente. O médico perguntou porque eu decidira cuidar de uma criança com tantos problemas, quando poderia assumir um menino normal. Respondi que aquela criança havia caído de paraquedas na minha vida. E eu não posso fugir dessa responsabilidade”.
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