Nestes últimos dias a Lagoa do Portinho voltou a ser o foco das manchetes da mídia local e estadual. O debate girou em torno do embargo da obra de abertura de um canal que ligaria a lagoa ao rio Portinho e que fora autorizada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente – SEMAR-PI.
O projeto consistia basicamente da reabertura de um desvio para o antigo canal natural soterrado pelas dunas que recebia água vinda do Oceano Atlântico através do Rio Portinho e seguia direto para o espelho d´água da Lagoa.
No entanto, no último dia 21 de março, o gerente regional da SEMAR Rarison Albuquerque disse em entrevista à imprensa que, a obra tocada pelos empresários que buscam a desobstrução do canal do rio Portinho até a lagoa, tinha sido embargada pelo órgão. Os empresários reagiram ao que classificaram de atitude de abuso do poder, eles disseram que irão representar o gerente da SEMAR no Ministério Público.
A confusão está armada! Mas, ao nosso juízo, seria necessário ir além do desejo daqueles que querem ver a Lagoa do Portinho cheia novamente. Antes há de se entender as causas do atual quadro de degradação. O descaso para com a Lagoa do Portinho tem promotores: Prefeituras de Parnaíba e de Luis Correia que sempre ficaram alheias à gestão ambiental desse recurso natural; Governo do Estado que sempre promoveu o espaço como ponto turístico sem dotar e cuidar devidamente como tal; e a sociedade em geral que colabora jogando lixo, desmatando, barrando o rio e se omitindo no cuidar de um patrimônio que é de todos. Cada segmento contribui(u) à sua maneira com o quadro caótico hoje existente.
Reverter essa situação atual é possível? Sim, mesmo não sendo fácil! Sobretudo, é necessário que os atores sociais envolvidos com a trama da promoção da sua degradação sejam chamados e responsabilizados a cuidar da lagoa com outro olhar e outra prática de uso e ocupação da bacia do Portinho.
O simples desnudamento e enfrentamento dos promotores dos crimes contra a lagoa não serão suficientes para salvá-la. É preciso um trabalho contínuo de educação socioambiental, contenção das dunas que avançam sobre ela, intervenções de obras civis para requalificação urbana, recuperação da vegetação ciliar, programa de peixamento, desobstrução do leito do rio, tudo isso de forma integrada e sistemática. Qualquer uma destas ações isoladas será mero devaneio...
Note-se que é necessário um agrupamento de pessoas e instituições que se sintam comprometidas com a causa da revitalização da lagoa, ninguém faz nada sozinho! Partir desta consciência é o primeiro passo. A hora exige maturidade, lucidez e o necessário desapego às vaidades pessoais.
A “intenção” da reabertura desse antigo canal é boa, mas por si só não resolve o problema. Houve o embargo (paralização da obra) pela falta do devido licenciamento ambiental. Há de se perguntar: pode-se fazer uma obra deste tipo? Claro que pode! Como dito pela própria SEMAR basta ter o projeto e apresentar para apreciação e posterior autorização. E por que o rito não é cumprido? Parece que falta mais diálogo e bom senso do que propriamente a imposição da legislação que recomenda estudos aos impactos causados. Afinal, impacto ambiental maior é promovido a todo o ecossistema da bacia do rio Portinho em razão da promoção de um estilo de vida predatório, de exploração irracional.
Ao longo dos anos fomos vencidos pelo cansaço, nos tornamos um povo apático a tudo isto. Somos pacíficos, mas não precisamos ser omissos. Mobilizamo-nos e choramos por uma partida de futebol; organizamo-nos numa escola de samba para desfilar por pouco mais de uma hora em uma passarela de carnaval; fazemos das tripas coração para promover a cultura do bumba meu boi ou das quadrilhas juninas; mas, somos incapazes de nos indignarmos com a degradação da Lagoa do Portinho. E não é só ela que sofre, temos ainda a Lagoa do Bebedouro e a Lagoa da Prata, igualmente belas e de importância vital para muitas famílias e que agonizam com a complacência do poder público!
Sem desânimo, humildemente, proponho duas sugestões: (i) elaborar estudos com vista à implantação de uma Unidade de Conservação, de âmbito estadual, na área do Complexo da Lagoa do Portinho; e (ii) estudar e promover a gestão da micro bacia do rio Portinho com vista a implantação de um Comitê Gestor formado pelo poder público, seus usuários e a sociedade civil.
Transformar a área numa Unidade de Conservação tem a função de salvaguardar o habitat e o ecossistema do território e suas águas jurisdicionais, preservando o patrimônio biológico existente. Além disso, garantindo às populações tradicionais o uso sustentável dos recursos naturais de forma racional e ainda propiciando às comunidades do entorno o desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis.
A bacia hidrográfica como unidade de planejamento já é de aceitação mundial, uma vez que esta se constitui num sistema natural bem delimitado geograficamente, onde os fenômenos e interações podem ser integrados. A gestão de bacia é o que há de mais moderno em termos de planejamento territorial. Fica a dica!
(*) Fernando Gomes, sociólogo, eleitor, cidadão e contribuinte parnaibano.