Final da tarde de sábado (12 de março) o telefone toca, era a Gláucia me chamando para ir urgente com o Germano para Campo Maior, pois o quadro de saúde do seu pai tinha se agravado. Imediatamente peguei a estrada chegando lá por volta das 22h. Fui direto vê-lo no quarto. Estava ali um cidadão justo e de caráter irretocável respirando com o auxílio de aparelhos. Lutava há algum tempo contra um câncer.
O quadro de desolação e dor entre os parentes era flagrante. O fim daquela jornada se aproximava! O amor e a dedicação que ele sempre deu à sua família foi retribuído durante todo o tempo em que ele lutou contra essa agressiva enfermidade. No leito da sua casa e com o carinho da esposa, filhas, netos e genros ele partiu na manhã do dia 13 de março. Data atribuída aos “Heróis do Jenipapo”. Nessa difícil tarefa de conviver, Antonio Wilson Maia, cumpriu o seu legado com honradez, era um cidadão de bem!
Embora estando mais longe, pude acompanhar de perto a ternura e o amor incondicional que o Sr. Maia recebeu da família, me orgulhei de ver externado por todos o que ele mais deu de si: amor! Talvez, se pudesse proferir algo antes de partir, diria: “vou feliz!”.
Somente o amor nos dá condições de cuidar do outro até o fim. Como já relatou Padre Fábio de Melo “se você quer saber se o outro te ama de verdade, é só identificar se ele seria capaz de tolerar a sua inutilidade. Quem nessa vida pode ser inútil pra você sem que você sinta o desejo de jogá-lo fora? Porque só nos ama, só vai ficar até o fim, aquele que, depois da nossa utilidade, descobrir o nosso significado. Por isso eu sempre peço a Deus para poder envelhecer ao lado das pessoas que me amem. Aquelas pessoas que possam me proporcionar a tranquilidade de ser inútil, mas ao mesmo tempo, sem perder o valor”. Depois da nossa utilidade é que se descobre o nosso verdadeiro significado!
E com o Sr. Maia foi assim, o seu significado marcou as nossas vidas substancialmente pelo seu exemplo como filho, irmão, tio, sogro, esposo, pai, avô e amigo. Nos seus 79 anos de vida contou com um inestimável patrimônio familiar e de amizade que construiu ao longo da jornada. Por isso, é hora também de agradecer, sim, agradecermos ao Grande Arquiteto do Universo pela dádiva de ter experimentado a convivência com ele. Quantos momentos vivenciamos ao seu lado: amamos, sorrimos e choramos...
Quando somos tocados pela dura e inevitável realidade da perda de um ente querido nos tornamos mais sensíveis, reflexivos e até mais humanos. Lamentavelmente essa sensação não é duradoura, se assim fosse, por certo viveríamos um mundo melhor, a partir de nós mesmos!
É nessa hora que nos damos conta de que partir é experiência inevitável. E nisso reside todo o sentido do segredo de um mundo que não sabemos. O sofrimento pode nos ajudar a mensurar o valor da vida que nos pertence(?). Num rápido exercício, olhamos ao nosso redor e descobrimos que possuímos coisas que não precisamos. E ainda assim, de vez em quando, nos pegamos desejando algo que não faz sentido, inevitavelmente, concluímos que mais da metade do que “conquistamos” não nos serviu pra nada!
Pela morte, somos “forçados” a refletir sobre certos valores que estão presentes em nossa vida e que negligenciamos. Que bom seria se fosse um exercício constante. Com ela uma angústia nos leva a questionar sobre o que estamos fazendo com nossas vidas e mais ainda, qual o verdadeiro significado de tudo isso?! Mário Sérgio Cortella nos ajuda a entender esse conflito existencial: “Estamos em um momento de transição, de turbulência muito forte em relação aos valores. Há uma necessidade urgente de a vida ser muito mais a realização de uma obra do que um fardo que se carrega no dia-a-dia”.
A obra deixada pelo Sr. Maia é simples e regada por uma conduta justa e fraterna. O bom caráter semeado por ele nos deixa orgulhosos. A saudade que se instala é fruto da sua marcante presença em nossas vidas. A saudade não é só um sentimento de ausência. A saudade é o sentimento de presença de quem não está. A verdadeira saudade não se desfaz. É a lembrança viva, é uma memória que aquece e às vezes arde, mas que não esfria, não se apaga. Que esta chama se mantenha acesa lembrando-nos seus ensinamentos!
A sua saudade é imensa, mas a lembrança da história de vida compartilhada entre nós nos permite o alento de saber que a nossa existência pode ser traduzida na letra da famosa canção brasileira composta por Tom Jobim: “É pau, é pedra, é o fim do caminho, é um resto de toco, é um pouco sozinho... é o fundo do poço, é o fim do caminho!”. Mas, mesmo diante as agruras e dificuldades há sempre a esperança e a possibilidade de renovação quando ele lembra: “São as águas de março fechando o verão, é a promessa de vida no teu coração” (Águas de Março, 1972). Que a água que transbordou de nossa alma nesses dias seja também responsável por trazer a mudança necessária para tocarmos os desafios deste e de outros verões!
Descanse em paz e que assim seja!!!
(*) Fernando Gomes, sociólogo, eleitor, cidadão e contribuinte parnaibano.