27 de set. de 2013

Não quero faca, nem queijo. Quero a fome.

Esta frase é da escritora mineira Adélia Prado e Rubem Alves, explica: “O comer não começa com o queijo. O comer começa na fome de comer queijo. Se não tenho fome é inútil ter queijo. Mas se tenho fome de queijo e não tenho queijo, eu dou um jeito de arranjar um queijo…”
Isso tem tudo a ver com a política. Com o momento político que vivemos em nosso país, em nosso estado e em nossa cidade. O representante político outorgado pelo povo através do voto não é um mero detentor de mandato, mas alguém que deveria instigar no cidadão a fome de participar, a vontade de colaborar mais e mais.
De que adianta reclamar da qualidade da representação política se no período eleitoral votamos sem o devido cuidado, sem critério algum?  Dizia Sócrates que as pessoas são capazes de buscar as respostas de forma autônoma se forem questionadas devidamente. A pergunta é a base do método socrático. Sim, devemos questionar, criar pontos de interrogação em nós mesmos e nos políticos. Isso é gerar a fome. E depois disso, partimos para o desejável controle social participativo.
Alguém pode dizer que esse processo é utópico, muito moroso. Eu diria que é lento, mas efetivo. Ao procurar as respostas, normalmente aprendemos muito mais do que o que estava dito na pergunta. E ainda ficamos preparados para o momento em que não teremos ninguém por perto para nos auxiliar mais diretamente, ou seja, aprendemos a pensar autonomamente. Eu também creio que o método “tradicional” de se fazer política, no fim das contas, termina sendo ainda muito mais lento e prejudicial à sociedade, pois exige práticas ilícitas e ainda termina por disseminar um modelo que homogeneíza a sociedade, tendo em vista que parece lógico e razoável todo mundo tirar algum tipo de vantagem, sem pensar no coletivo.
Uma grande maioria dos políticos usa um método estabelecido pelo sistema dominante. Muito do que é praticado não é objeto da participação ou necessidade da sociedade. Então por que não invertemos a ordem das coisas? Por que não começar pelas perguntas? Eis o desafio. Iniciar pelo problema, pela dúvida, pelo objeto de curiosidade das pessoas. Se queremos um representante de qualidade por que  não escolhemos um representante de qualidade? Quem é esse? Qual a sua conduta, seu caráter? Seus hábitos e costumes são respeitáveis? Afinal devo confiar nele?
E ao refletir sobre como por em prática isso tudo, uma nova pergunta surge: “O interesse de um, não é o interesse do outro. E aí? Como fazer para atender a interesses individuais num ambiente coletivo?” A resposta está em contemplar os interesses coletivos acima dos individuais.
Um único político (ou poucos, como é o caso) falando em ética, solidariedade e justiça  a uma população que tem interesses distintos e muitas vezes individualistas, é um desperdício! É dar queijo e faca para muitos que não estão com a mínima fome ou mesmo vontade de comer.
Refletindo sobre isso, chegamos à conclusão de que é preciso aprender a instigar a fome dos eleitores. É uma árdua tarefa que devemos todos abraçar. Não há receita pronta, nem mágica, mas um trabalho árduo, persistente e amoroso que deve ser empreendido para tocar o coração e a mente de cada pessoa individualmente. Sei que tal mudança não ocorre do dia para noite, mas ao longo de um período de muita maturação e experimentação contínua.
Logo, propor-se a não responder as perguntas aos outros explicando o porquê de vivermos em uma sociedade que não promove os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade não é a melhor saída. Vamos permitir que os outros pensem, logo encontrarão a resposta e nesse caminho poderão refletir sobre as razões estratégicas que mantêm as coisas como elas são. Pense nisso!
Para finalizar, mais algumas sábias palavras do Rubem Alves que sintetizam essas reflexões: “(… ) se o desejo for satisfeito, a máquina de pensar não pensa. Assim, realizando-se o desejo, o pensamento não acontece. A maneira mais fácil de abortar o pensamento é realizando o desejo. Esse é o pecado de muitos pais e professores que ensinam as respostas antes que tivesse havido perguntas.”


(*) Fernando Gomes, sociólogo, cidadão, eleitor e contribuinte parnaibano.

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