1 de jul. de 2016

Corrupção e fraude em obra de porto no Piauí, aponta delação premiada

Delação premiada aponta corrupção e fraude em obra de porto no Piauí; Ao todo são 12 os denunciados pela Justiça, entre eles três ex-secretários. Obra do que seria o 1º porto marítimo do estado se arrasta há 40 anos.
Maresia já provocou a oxidação das estruturas de ferro já utilizadas na obra do porto (Foto: Kleber Nogueira)





























A delação premiada de Anderson Castelo Branco, então engenheiro-fiscal da Secretaria de Transportes do Piauí (Setrans), deu indícios dos crimes de peculato, corrupção ativa, formação de quadrilha e fraude em licitações da obra do porto de Luís Correia, no litoral do Piauí. Ao todo são 12 os denunciados pela Justiça, entre eles três ex-secretários do governo do estado, servidores públicos e empresários. A iniciativa já custou mais de R$ 390 milhões aos cofres públicos.

O Piauí é o único estado litorâneo brasileiro sem porto. O projeto de construção do primeiro terminal marítimo começou ainda na década de 1960 e as obras foram iniciadas em 1976. Mas, após 40 anos, o Porto de Luís Correia é apenas um cais abandonado, de estrutura deteriorada, onde repousam materiais e maquinários enferrujados. O Ministério Público Federal fez investigação que apontou uma série de irregularidades e em agosto de 2014 a denúncia foi aceita pela Justiça Federal.

O primeiro documento a ser postado no acompanhamento processual do site da Justiça Federal citando a delação foi uma decisão do juiz José Gutemberg de Barros, de Parnaíba, vara onde corre o processo, foi publicado no sistema eletrônico em 1º de junho deste ano.

Constam cerca de 20 citações à delação premiada de Anderson Castelo Branco, sobretudo aos ex-secretários de transportes do Piauí Luciano Paes Landim, Alexandre Nogueira e Norma Maria da Costa Sales e do ex-superintendente de obras da Setrans, Marlus Fernando de Brito Melo.

Eles e mais outras nove pessoas respondem por supostos crimes cometidos na construção do Porto de Luís Correia, construção iniciada há 40 anos. Em maio de 2013, o G1 mostrou toda a cronologia da polêmica obra que já custou mais de R$ 390 milhões aos cofres públicos e está parada desde 2011.

Contra Luciano Paes Landim, o delator informou em juízo que o gestor tinha conhecimento que a empresa Staff, que tocava as obras no porto, estava sendo paga sem que os serviços estivessem sendo realizados. “Luciano e Marlus tinham conhecimento de que as obras eram atestadas sem sua realização e que entendiam ser a única forma de pagar as obras realizadas pela construtora", disse Anderson.

Sobre o então secretário Alexandre Nogueira, o juiz federal José Gutemberg de Barros afirma que a deleção reforçou os indícios de que o gestor determinava que fossem feitas medições falsas sobre a obra, o que fundamenta a tese de que houve superfaturamento da obra.
Trecho da delação premiada que consta em documento do MPF (Foto: Reprodução)
“Que já conversou com o Marlus e o Alexandre sobre essa questão, sendo que o último visitava diretamente a obra, de forma que afirma que o mesmo tinha conhecimento técnico para entender esse procedimento", diz trecho da decisão judicial que cita a delação.

A reportagem procurou Alexandre Nogueira e tentou por várias vezes contato telefônico com ele, mas não obtivemos retorno.

Norma Maria também foi citada pelo delator como conhecedora dos boletins com dados falsos. "Que a Norma conhecia esse procedimento desde o momento em que fora diretora, pois nessa época já era responsável pelos instrumentos; que, inclusive, a segunda etapa da obra foi renegociada na sala da Norma e que, nesta oportunidade, inclusive, alertou sobre essas impropriedades, especialmente por estar constando coisa ainda do primeiro contrato neste segundo". O G1 não conseguiu localizar Norma Maria.
Procurador Kelston Lages, responsável por denunciar irregularidades (Foto: Catarina Costa / G1)
O MPF acusa o ex-superintendente de obras da Setrans Marlus Fernando de homologar boletins de medição apontados como falsos, indício de suposta existência de superfaturamento da obra. “Eram de pleno conhecimento do Superintendente de Obras Marlus Fernando".

O G1 conseguiu falar com o ex-superintendente de obras Marlus Fernando, no entanto, ele disse que não irá comentar sobre as informações dadas pelo delator e nem se posicionar sobre o processo em que é denunciado.

O delator Anderson Castelo Branco também é acusado de participar do esquema criminoso, em que teria contribuído em licitações direcionadas e fraudes para o desvio de dinheiro público. Em troca de ele contar o que sabe sobre os crimes, o suspeito pode ter sua pena reduzida em até 2/3, em caso de condenação.

Mais de R$ 390 milhões já foram gastos
(Foto: Jordana Lima)
A reportagem procurou o delator, mas ele também não foi encontrado para comentar o fato.

A decisão do juiz José Gutemberg reitera que 12 dos 13 denunciados pelo MPF continuam respondendo por vários crimes como peculato, corrupção ativa, formação de quadrilha e fraude em licitações. Todos os acusados pediram para serem retirados do processo sob as mais diversas alegações, mas apenas um foi excluído dos autos.

Segundo o procurador federal Kelston Lages, a deleção premiada de Anderson estava sob segredo de Justiça até o início deste ano, quando ela foi homologada pela Justiça e ganhou domínio público.

“O acordo de delação vem desde 2014, mas por várias manobras dos advogados de defesa, a audiência em que o Anderson daria seu testemunho para a Justiça foi sendo adiada (por dois anos) até que foi realizada apenas no dia 26 de janeiro”, disse.

Maresia já provocou a oxidação das estruturas de ferro utilizadas nas obras (Foto: Gilcilene Araújo/G1)
O Ministério Público Federal, que acusa os crimes na obra do porto de Luís Correia, afirma que foram gastos cerca de R$ 16 milhões em dois contratos com empresas que fazem parte do esquema fraudulento. O MPF alega que encontrou graves irregularidades como: licitação direcionada, superfaturamento e até a falta de estudos de viabilidade técnica.

Após a constatação, o MPF abriu duas ações: uma de natureza criminal e outra de improbidade administrativa. O objetivo é o ressarcimento de R$ 14 milhões em recursos ao erário, equivalente a soma dos dois contratos de construção do porto.

A delação premiada de Anderson Castelo Branco foi realizada para o processo penal, mas o procurador quer levar as informações prestadas pelo engenheiro também para processo administrativo.

“Queremos que a delação também sirva de subsídio para o processo que apura a improbidade. Não faz sentido fazermos um novo pedido de delação e a pessoa tenha que fazer tudo de novo. O juiz ainda não julgou essa demanda”, completou Keston.

Por Pedro Santiago/G1 PI

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