Mau caratismo e violência!
(Prof. Geraldo Filho – UFPI)
(11/05/2015)
Há pouco mais de um mês morreu Eduardo Galeano, escritor uruguaio que em 1971 lançou “As Veias Abertas da América Latina”, livro que influenciou gerações de jovens latino-americanos que viram na obra (a começar pelo título dramático!) a realização das ideias mistificadoras esquerdistas (marxistas), que afirmavam que os países subdesenvolvidos dessa parte do continente eram vítimas impotentes da sanha imperialista do capitalismo europeu e norte-americano. Assim se justificava a metáfora melodramática das tais veias abertas, pois a sangria desatada seria alegoricamente as riquezas sugadas pelo vampirismo econômico das economias desenvolvidas.
Convencidos por essa metáfora sanguínea, muitos jovens pegaram em armas e perderam as vidas em guerrilhas rurais e urbanas que, travestidas de lutas pela democracia contra as ditaduras capitalistas, tinham como objetivo implantar regimes totalitários comunistas de inspiração chinesa, cubana ou soviética.
Galeano, ao construir sua análise delirante tinha, se não me falha a memória, 31 anos, portanto, ainda muito jovem, o que, forçando um pouco, poderia lhe garantir um relativo benefício atenuante decorrência da irresponsabilidade juvenil. O problema é perguntar, se for possível, para as famílias dos jovens que morreram, ou mesmo para esses jovens, se fosse possível consultá-los no além, o que eles acharam do arrependimento de Galeano depois de 30 anos do lançamento do livro, quando já no século XXI, após dobrar os 60, ele reconheceu publicamente que não tinha formação histórica e nem preparo econômico para escrever a obra! Ou seja, famílias foram arrasadas com a morte dos filhos e vidas jovens feneceram precocemente motivadas pela irresponsabilidade de um idiota demagogo.
O que me deixou incomodado foi o pouco destaque dado pela imprensa a essa passagem da vida do escritor uruguaio quando de sua morte, que optou por elogiá-lo como “grande intelectual” latino-americano, etc. Provavelmente, esse é um traço do caráter hipócrita brasileiro, que esquece o passado negativo de alguém depois que ele vira finado, varrendo para debaixo do tapete seus crimes e pecados!
E fico mais incomodado ainda porque ideias deletérias como as de Galeano ainda causam estragos terríveis nas sociedades latino-americanas! A Venezuela, o Brasil e a Argentina exemplificam isso em graus diferentes, mas os três têm em comum a retórica populista anti-EUA e União Europeia, o intervencionismo estatal sufocante (o Estado se metendo na vida cotidiana de toda a sociedade), o fraco desempenho econômico (desemprego e inflação em alta) e a corrupção em todos os níveis de governo.
Mas, de onde provém a persistência dessas ideias?! Talvez a melhor explicação seja a da sua equiparação com o objetivo replicante dos genes presente nos genomas de todos os organismos vivos.
Tal qual os genes que buscam se replicar disseminando-se pelos corpos, as ideias (agora batizadas de “memes”, por Richard Dawkins) lutam por se propagar utilizando-se de todos os meios materiais possíveis, principalmente o mais extraordinário de todos: o cérebro humano. Às que têm sucesso conjugam três características: fidelidade à ideia original (elaboração diferente de um mesmo conteúdo); fecundidade (elas se insinuam pelas instituições, porém mantêm o objetivo inicial, por exemplo, a instauração de uma ditadura socialista pela via eleitoral democrática); e, finalmente, a longevidade (a garantia de sua permanência e sucesso reprodutivo em qualquer circunstancia histórica).
É muito importante notar que o sucesso de uma ideia não significa obrigatoriamente benefício para a sociedade. Sucesso para um “meme” é a garantia de sua permanência e propagação ao longo do tempo. O que quer dizer que ideias (“memes”) que se consolidam nas instituições que formam uma sociedade podem ser adaptativamente funcionais (benéficas para a sobrevivência social) ou disfuncionais (deletérias, que colocam em perigo constante a liberdade e a vida das pessoas).
O que estou tentando mostrar é que as instituições sociais (que são a consolidação das ideias como organização jurídica, política, religiosa, social, estética, econômica, etc.) podem ser analisadas sob a perspectiva da contribuição que elas podem dar para a melhor adaptação possível do individuo à sua sociedade.
Nessa perspectiva, a violência que assola o país só pode ser compreendida como o fracasso de “memes” deletérios que se consolidaram em instituições sociais como a Constituição, o Código Penal e o Sistema Educacional, que são absolutamente disfuncionais à sociedade onde elas vigem, gerando inadaptações que tornam “normal” e “corriqueiro” aquilo que deveria ser percebido pela população como “anormal” e “exceção”. Não se pode aceitar como fato banal 56 mil homicídios por ano (2014) sem que essa sociedade não esteja em estado de guerra. Se essa sociedade não reage vigorosamente a este dado catastrófico é porque instituições sociais deletérias atingiram o sucesso: ou seja, ela caminha para a decadência.
Um exemplo da eficiência metamórfica dos “memes” esquerdistas que se consolidaram nas instituições jurídicas que estimulam a violência foi a entrevista da Profª Lilian Moritz-Schwartz, no programa Diálogos, da GloboNews (07/05). Nela, a professora que é uma grande historiadora (eu tenho e li seus livros!) mas que como antropóloga deixou a desejar, disse que o problema da violência no Brasil deve-se à desigualdade social, cuja origem se encontra na exclusão e na brutalidade do passado escravista e, não satisfeita, ainda disse que o mundo tem uma dívida com a África!
Segundo um dos melhores filósofos brasileiros da atualidade, Luiz Filipe Pondé, esses chavões são bons para os professores posarem de populares e “progressistas” entre os alunos nas universidades! E eu acrescento: aproveitando para esconderem a indigência e a preguiça intelectual (pois só o que vejo é professor não ler livro).
Uma boa antropologia tem necessariamente de ser comparativa, se não for é ficção literária ou romance histórico! Vamos lá: Não conheço, na história da Grécia, nenhum período em que se matasse e roubasse nas proporções do Brasil atual por causa do passado escravista grego; idem para o Império Romano; Egípcio; Persa; Japonês; Inglês, Espanhol, “Americano”, etc. Não conheço nenhum dos povos herdeiros desses impérios que escravizaram gente aos montes pagando penitência e alardeando que têm dívidas para com os herdeiros daqueles que eles escravizaram.
Nenhum desses povos justifica os crimes de suas sociedades contemporâneas referindo-se ao passado ou a desigualdade social, a não ser para as mentes fantasiosas dos “intelectuais esquerdistas”, que veem o mundo como querem e não efetivamente como ele é, atitude que Galeano só adotou envergonhadamente aos 60 anos. Porém, no Brasil, constantemente somos lembrados de que a sociedade é responsável pela violência, cuja origem é a desigualdade social e o passado escravista.
Ora, esse “meme” falacioso facilmente é desmascarado por uma constatação simples: com todos os avanços socio-econômicos das últimas décadas os índices de homicídio e roubo não diminuíram, pelo contrário, aumentaram! Portanto, a explicação do problema está em outro lugar.
As instituições jurídicas e educacionais brasileiras são imprestáveis sob o ponto de vista adaptativo, porque são disfuncionais, pois foram construídas a partir de ideias que encarnaram “memes” deletérios. Assim, as instituições jurídicas em vez de punirem e afastarem da sociedade os criminosos (tal qual fenótipos inaptos são eliminados pela seleção natural), aqui no Brasil têm como função “socializarem” os bandidos; as instituições educacionais em vez de prepararem os alunos para a competição no mercado de trabalho, estimulando a meritocracia, aqui entre nós têm como função “formar cidadãos críticos” (vá fazer uma entrevista no RH de uma empresa e chegue dizendo que é um “cidadão crítico” para ver o que acontece)!
Na prática, o que está acontecendo é a propagação e o predomínio na sociedade de comportamentos cada vez mais violentos e corruptos, porque em razão da disfuncionalidade (inaptidão) das instituições sociais que deveriam neutraliza-los e reprimi-los eles encontram ambiente favorável para se desenvolver e multiplicar.
Países desenvolvidos são desenvolvidos porque suas instituições são adequadas para sustentar um processo de crescimento e distribuição equitativa da riqueza gerada ao longo de décadas. Elas são flexíveis e adaptáveis às necessidades da passagem do tempo em suas sociedades. Países atrasados, como o nosso e a maior parte dos africanos, são atrasados porque suas instituições foram erigidas sobre premissas falsas e deletérias. Veja-se o exemplo da Magna Carta, origem da democracia inglesa, promulgada em 1215 e que este ano completa 800 anos, por séculos adaptando à Inglaterra a uma sociedade aberta e livre. Agora, veja-se a enorme dificuldade que o Brasil encontra para baixar a maioridade penal para 16 anos (que sequer deveria existir, pois um indivíduo, independente de idade deveria pagar pesadamente pelo caráter hediondo do crime cometido) ou para regulamentar os serviços de terceirização (observem quem é contra isso!!!).
O problema, portanto, reside na qualidade adaptativa e funcional das instituições que formam o país, mas é sempre mais fácil transferir a responsabilidade para um passado de ficção ou para outros países, assumindo a postura de vítima ou a do “patinho feio”, comportamento a que o brasileiro foi acostumado.
Para finalizar, outro “meme” deletério veiculado pela Profª Schwartz e tão caro aos professores universitários é o de que os portugueses cometeram genocídio contra os índios, que de acordo com ela tinham uma profunda filosofia! Se tivesse ocorrido o tal genocídio o Brasil não seria o país caboclo que efetivamente é. A Profª deveria saber, como antropóloga, que a maioria dos brasileiros adora dormir e transar em rede, da mesma forma que gosta de farinha e tapioca, tais hábitos dificilmente vingariam se tivesse ocorrido genocídio. O que houve foi a substituição de uma população por outra miscigenada, cabocla, que por não ter ainda formulado corretamente instituições sociais adequadas corre o sério risco de desaparecer, vítima de seus próprios predadores.